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quinta-feira, 24 de maio de 2012

Sea Containers e Orient-Express

Em 1989, quando o Copacabana Palace foi adquirido pelo grupo Orient-Express, não foi propriamente o Orient-Express que o adquiriu, e nem a pessoa física do James Sherwood  (como muitas pessoas no Brasil pareciam acreditar) e sim, a Sea Containers, a empresa  a qual Orient-Express pertencia.  E que o James Sherwood tanto era  o fundador, Chairman, e CEO da Orient-Express, como era também fundador, Chairman e CEO da Sea Containers, uma empresa de leasing de conteiners marítimas, fundada por Sherwood e alguns sócios em 1965 com um capital inicial de US$100 mil,  logo no inicio da conteinerizacao do frete marítimo mundial.  O sucesso da empresa foi tanto que quando a empresa teve suas acoes lancadas na bolsa de Nova York, quatro anos depois, fez do Sherwood, então com 36 anos de idade, um multi-milionário.  A empresa continuou a prosperar e gerar lucros altos ao longo da década de ’70, e foi este sucesso que possibilitou  ao Sherwood convencer os diretores da Sea Containers  a diversificar seus investimentos, tendo adquirido - quase por acaso -  o primeiro hotel do grupo,  o Hotel Cipriani em Veneza, em 1976.  No ano ano seguinte, o Sherwood teve a brilhante ideá de comprar em leilão alguns dos antigos vagões do famoso trem Orient-Express, com a ideia de re-lançar o Orient-Express como um trem de turismo, ligando Londres a Veneza.  O projeto de re-lançar o Orient-Express consumiu cinco anos de trabalho, e custou US$31 milhões – muitíssimo acima do orçamento original, mas ao ser lançado em 1982 tornou-se mais um espetacular sucesso, e gerou tanto interesse da mídia mundial que motivou a decisão de adotar o nome Orient-Express para todo o grupo  hoteleiro.  Durante boa parte da década de ’80 tanto a Sea Containers como a Orient-Express continuaram a gerar bons lucros e novos hotéis foram adquiridos, incluindo o Mount Nelson em Cape Town em 1988 e o Copacabana Palace em 1989.  A aquisicao do Copacabana Palace ocorreu num momento especialmente critico pois a Sea Containers havia se tornada alvo de um “hostile take-over bid” do grupo sueco Stena, de qual conseguiu se defender, apos quase um ano de disputa.  Por esta razão, entre outras, a década de ’90 iniciou-se de uma forma bem mais complicado para o grupo do Sea Containers, do que as décadas anteriores.  Para complicar ainda mais, a Guerra do Golfo,  iniciada em agosto de 1990 com a invasão de Kuwait pelas tropas de Iraque, e que resultou na invasão do Iraque pelas forcas da coalizacao ocidental liderada pelos Estados Unidos, provocou uma queda brusca de turismo americano para a Europa prejudicando  o desempenho dos hotéis italianos, tao importantes para o sucesso do grupo.



          Este conjunto de fatores teve um efeito direto para o Copacabana Palace, pois com a piora dos resultados,  o grupo não conseguiu arrumar o financiamento para iniciar as obras de reforma do hotel, embora o planejamento das reformas e algumas “maquinagens” seguiram adiante.  Apos algumas hesitacoes iniciais, o Sherwood acabou determinando que o decorador francês, Gerard Gallet,  homem de confiança do Sherwood, e que havia sido o responsável por toda a decoracao do trem seria o responsável pela reforma do Copa.  Fazia muitos planos, mas as obras de reforma não começavam.  Apesar disso, o dia a dia no Copa continuava agitado, pois a chamada “reforma administrativa” continuava a todo vapor, com a implantacao do sistema uniforme de contas para hotéis, necessário para adaptar as contas do hotel ao padrão do Orient-Express, e, principalmente, as providências para mudar o sistema de taxa de serviço e resolver o problema dos funcionários estáveis, que contarei em detalhes no próximo capitulo.

segunda-feira, 21 de maio de 2012

O Board Meeting e o Plano Collor

No final de 1989 o James Sherwood, Chairman e CEO do grupo Orient-Express, anunciou que  a próxima  reunião do Board seria realizado no Copacabana Palace, e determinou que a data da reunião coincidisse com o sábado de carnaval.  Seria uma boa oportunidade para os membros do “Board”   conhecer o mais novo hotel do grupo e tomar conhecimento dos planos de reforma, alem de conhecer o famoso carnaval carioca.   Recebi intrucoes para organizar a reunião, incluindo toda a programacao social, que incluía providenciar camarotes para assistir o desfile das Escolas de Samba, passeios de barco pela Baia da Guanabara, jantares em restaurantes famosos, etc. etc.  Alem disso, fui informado que  eu deveria preparar uma apresentacao para o “Board”,  demonstrando  o problema encontrado quanto ao passivo trabalhista  e a forma de distribuicao da taxa de serviço, e uma plano de acao para solucionar o problema.   Se organizar uma reunião de um “Board”,  composto exclusivamente por estrangeiros,  já e uma tarefa complicada em quaisquer circumstancias,  imaginem ter que fazer isto no meio do carnaval, e com todos os membros do “Board” acompanhados pelas esposas!  Acrescenta a isso a responsabilidade que eu teria de fazer a referida apresentacao ,  não tenho duvidas em afirmar que o ocasião representava um verdadeiro “prova de fogo”, tanto para mim pessoalmente, como para todo a equipe do Copa.   A primeira providência que tomei foi de cancelar o Baile de Carnaval, que estávamos planejando reeditar no Sábado de Carnaval de 1990, apos uma interrupcao de quase 20 anos.  Conforme expliquei para Oscar Ornstein, nosso Diretor de Relacoes Publicas, “Organizar este Board Meeting  já vai ser um Baile, não precisamos inventar outro.  Vamos deixar nosso projeto para o ano que vem!”

No fim das contas, tudo acabou dando certo. Todos adoraram o carnaval carioca, e ficaram deslumbrados com o espectaculo do desfile das Escolas de Samba.   A reunião formal do Board também foi um sucesso e o Board aprovou as obras de reforma do hotel, e ainda aprovaram meu plano para solucionar o problema dos funcionários estáveis e a distribuicao da taxa de serviço.  Com este grande desafio ultrapassado, poderíamos ate supor que teríamos alguns meses de relativa tranquilidade pela frente.  Puro engano. Pouco mais que um més apos a reunião do Board assumiu a Presidência da Republica o Sr. Fernando Collor de Mello, e no dia seguinte ele anunciou a implantacao do “Plano Brasil Novo”, ou “Plano Collor”, como veio a ser conhecido.  O plano era uma tentativa arrojada de estabilizar a inflacao galopante que vinha minada as finanças da nacao há décadas.  A media mensal de inflacao nos 12 meses anteriores a implantacao do plano tinha sida de quase 30%, e no mês de marco de 1990 a índice mensal de inflacao atingiu um pico de 81%!  O Plano envolvia uma serie de medidas, mas a mais polemica e mais impactante foi o congelamento, ou confisco, de todos os ativos monetários, tanto das pessoas físicas como das empresas, por um período de 18 meses.  Alem disso, todos os preços e todos os salários foram congelados. Estas medidas  provocaram uma forte retracao de toda a atividade comercial e industrial.  O efeito no movimento hoteleiro no Rio de Janeiro foi devastador, com as taxas de ocupacao de todos os hotéis despencando para níveis jamais vistos antes.  Para o Copacabana Palace, que já não vinha bem, o efeito foi terrível.  Mais difícil ainda, era tentar explicar para a matriz em Londres o que estava acontecendo no Brasil.  Inicialmente, o plano conseguiu frear a inflacao, mas apos poucos meses a inflacao retornou com toda forca.  O Plano Collor foi substituído pelo Plano Collor II, e depois pelo Plano Marcílio, ate ser finalmente abandonado apos o impeachment do Presidente Collor em setembro de 1992.  O Plano teve como mérito  servir de embrião para o bem-sucedido Plano Real, implantado em julho de 1994, e que finalmente acabou com a hiperinflacao no Brasil, mas, para o Copacabana Palace, sobre a gestão do grupo Orient-Express, representou o inicio de um longo período de dificuldades financeiras que somente seriam superados quase seis anos depois!