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segunda-feira, 23 de junho de 2014

O Projeto de Búzios




Apesar da sua determinação e persistência, características típicas do grande empreendedor que era, nem todos os projetos do James Sherwood de expandir a presença do grupo Orient-Express no Brasil foram bem sucedidos.  O maior exemplo disso foi a tentativa de construir um hotel de alto luxo em Búzios, o balneário situado aproximadamente 100 km  ao norte do Rio de Janeiro. O Sherwood já tinha ouvido falar bem de Búzios antes mesmo de comprar o Copacabana Palace, e em fevereiro de 1990, na sua primeira viagem ao Brasil após ter comprado o Copa me pediu para organizar uma ida à cidade.  Ocorre que o único dia que o Sherwood tinha disponível na sua agenda para a visita era uma segunda-feira de carnaval.  Ponderei com Sherwood que uma segunda-feira de carnaval, e ainda mais pela manhã, não era a melhor hora de conhecer Búzios, mas não adiantou, e assim fomos conhecer Buzios numa segunda-feira de carnaval.  Saimos do Aeroporto Santos Dumont às 10hrs da manhā num learjet,  que não levou mais que quinze minutos para chegar  ao pequeno aeroporto de Búzios, próximo a Praia Rasa.  De lá fomos conhecer a famosa Rua das Pedras, no centro de Búzios. Chegando lá, mais parecia que tínhamos chegado à uma cidade fantasma do que um badalado balneário, frequentado pelo “jet-set” internacional, como Sherwood pensava de encontrar.  A rua estava completamente deserta, com todas as lojas e bares fechados.  O único sinal que havia alguma vida no local eram as latas de lixo que transbordava, fruto da badalação da noite anterior.  Fazia um calor sufocante, e após caminhar por alguns minutos todos estavam encharcados de suor, mas com todos os bares e restaurantes fechados, não havia nem como comprar um copo de água para refrescar.  Tinhamos sido convidados a almoçar no Hotel das Rocas, na Ilha Rasa, talvez o melhor hotel de Búzios naquela época.  O hotel pertencia ao empresário Umberto Modiano, que havia feito um esforço enorme para desenvolver o turismo em Búzios, tendo feito inclusive a construção do aeroporto de Búzios.  Mas, no meio de carnaval, com o hotel super-lotado, o restaurante do hotel mal dava conta de atender à demanda dos seus próprios hóspedes, quanto mais à uma mesa de “convidados”.  Como seria de esperar, o almoço não foi um sucesso, e no meio da tarde retornamos todos para Rio de Janeiro.  Durante os próximos quinze anos, o Sherwood nunca mais falou de Búzios.  Nas suas viagens subsequentes ao Brasil, visitamos vários outras cidades próximas ao Rio, incluindo Angra dos Reis, Parati, a região Serrana, e as cidades históricas de Minas Gerais, sempre com o intuito de encontrar uma possibilidade de ampliar a rêde.  De todas estas cidades, o que mais agradou ao Sherwood foi Tiradentes, em Minas Gerais,  e chegamos a iniciar conversações com os donos do Solar da Ponte, visando a sua aquisição.  O hotel entretanto era pequeno demais para o Orient-Express, e a compra só faria sentido de fosse possível comprar um terreno contigua ao hotel, para expandir-lo.  Como isto não foi possível, o negócio não foi feito.
Finalmente, em janeiro de 2005, quando Sherwood fazia sua habitual visita anual ao Copacabana Palace, eu estava  almoçando na Pergula com Sherwood e o Embaixador Mário Gibson Barboza,  Presidente do Conselho da Cia. Hotéis Palace, quando Mário falou de um amigo dele que queria vender uma casa grande em Teresópolis, que ele (o dono) achava que poderia ser transformado num hotel de luxo.  O Sherwood pensou um pouco e depois virou para mim e perguntou, “O que você acha?”.  “Não acho que Teresopolis é um destino interessante para o perfil dos nossos hospedes, que são majoritariamente turistas estrangeiras, e estão mais interessados em destinos de praia. Na minha opinião, a melhor cidade, nas proximidades do Rio, que reúne condições para complementar uma estadia no Copacabana Palace é Búzios”, respondi.  Sherwood me olhou fixamente por alguns instantes, e depois disse “Então me encontre um terreno em Buzios”, e com isso mudou de assunto.  Alguns meses depois, havíamos encontrado o que Sherwood queria.  Tratava-se de um terreno de 185.000 metros quadrados, defronte da praia da Azêda, uma das praias mais conhecidas, e cobiçadas, de Buzios.  Por estar situado dentro de uma área de preservação ambiental, só poderia construir em 3% do terreno, mas isto era o suficiente para o que queríamos fazer, e as consultas prévias sobre a viabilidade de aprovar o projeto foram todas positivas.  Vários executivos do grupo Orient-Express visitaram o local, e todos gostaram o local.  Finalmente, veio o próprio Sherwood, que, como sempre, teria a palavra final.  Desta vez, voamos para Buzios num helicóptero, em vez de um lear-jet.  Era um domingo, e o local de pouso mais próximo ao nosso destino era um campo de futebol, onde havia um jogo em andamento.  Com a aproximação do helicóptero, o juiz soprou seu apito  e todos os jogadores rapidamente se deslocaram para as laterais do campo, enquanto o helicóptero pousava no circulo central.  É que o dono do campo cobrava R$100,00 para cada pouso de helicóptero, que era mais do que ele cobrava para alugar o campo, daí a preferência.  Mesmo assim, senti um certo constrangimento ao descer do helicóptero sob os olhares curiosos dos jogadores e das centenas de espectadores do jogo.  Sherwood, entretanto, achou tudo muito natural.  Felizmente, a visita foi um sucesso, e Sherwood ficou encantado com o local.  Depois de algumas semanas de discussões, fechamos um acordo com o grupo vendedor onde adquiríamos 50% do terreno imediatamente, e os outros 50% após obter todas as aprovações necessárias para iniciar a construção.  Desenvolvemos então um belo projeto, de construir um hotel de apenas 42 apartamentos de alto luxo, divididos entre 14 bungalows, espalhados pelo terreno.  Cada apartamento do hotel teria quase 100 metros quadrados de área útil.  A antiga casa branca, que é uma das casas mais antigas de Búzios, seria preservada e transformada na área de recepção, e também local do restaurante, que seria um filial do restaurante Cipriani. A piscina do hotel, de tamanho semi-olimpics seria localizada num patamar há oito metros acima do nível do mar, e cercada de uma pérgula que ofereceria uma magnifica vista sobre a praia.  Fora isso o hotel ainda teria um Spa, e um pequeno local para realizar reuniões de alto nível.  Uma atenção especial foi tomada no que diz respeito à proteção do meio-ambiente, seguindo a própria filosofia do grupo Orient-Express, e consciente que o meio-ambiente é uma questão sensível em Búzios, resultado de especulação imobiliária desenfreada ocorrida na cidade no passado recente.  Para minimizar o incômodo aos vizinhos, todo o acesso dos hospedes ao hotel seria através do mar, com um "shuttle service" funcionando 24 horas por dia entre o cais das Rua das Pedras e um caís flutuante que seria construída nas proximidades do hotel, similar ao que existe no Hotel Cipriani em Veneza.  O hotel seria então, não apenas o hotel de praia mais luxuoso do Brasil, mas também um modelo em matéria de respeito ao meio-ambiente.  Mas, lamentavelmente, não era para ser. Quando tudo parecia caminhar bem para a aprovação do projeto fomos surpreendidos por um decreto do Prefeito de Búzios, incentivado pelo então Secretário do Meio-Ambiente do Estado do Rio de Janeiro, Carlos Minc, declarando a área do nosso terreno como área de utilidade pública, com vistas da implantação de um Parque  Municipal.  Mais tarde, o decreto do Prefeito foi superado por outro, de autoria do Estado do Rio, incorporando nosso terreno num projeto de criar o Parque Estadual Costa de Sol, e até hoje, passadas mais de cinco anos, ainda aguardamos a devida indenização por parte do Estado.  Enfim, coisas do Brasil.  A impossibilidade de levar adiante o investimento em Búzios, embora frustrante,  não representou nenhum grande prejuízo para o grupo Orient-Express.  Os investimentos previstos para acontecer em Búzios foram redirecionados para o sudeste de Asia, onde o grupo possui vários hotéis.  Já para a cidade de Búzios, a continuada ausência de um verdadeiro hotel de alto luxo, pertencente a um renomado grupo internacional, continua sendo um empecilho para o desenvolvimento de um turismo mais qualificado e rentável para a cidade.




terça-feira, 10 de junho de 2014

Hotel das Cataratas



Uma das estratégias do James Sherwood para fazer crescer o grupo Orient-Express era de adquirir um hotel chave em algum país, e depois adquirir outros para que o grupo adquirisse uma presença regional marcante.  Ele adotou esta filosofia na Italia, iniciando com o Hotel Cipriani em Veneza;  na Africa do Sul, com o Hotel Mount Nelson na Cidade do Cabo;  e no Peru, com o Hotel em Machu Picchu.  No Brasil, após a aquisição do Copacabana Palace, ele identificou o Hotel das Cataratas em Foz do Iguaçu como sendo o hotel ideal para expandir a presença do Orient-Express no Brasil.  O hotel tem uma localização privilegiada dentro do Parque Nacional, defronte das famosas cataratas do rio Iguaçu e por ser o único hotel dentro do Parque Nacional,  permite que seus hóspedes tem acesso exclusivo às cataratas antes e depois que o parque abre e fecha para o público. O Sherwood começou a se interessar pelo hotel em 1993, mas logo descobriu que o hotel pertence ao Governo Federal, e por estar localizado dentro do Parque Nacional, não poderá ser vendido.  Na época, o hotel era administrado pela rede Tropical, que pertencia a Varig, a companhia aérea de grande prestigio, que administrava o hotel sob um contrato de concessão.  Inicialmente, Sherwood tentou negociar com Tropical para que eles cedessem a concessão do Hotel das Cataratas para o grupo Orient-Express, e quando esta tentativa não logrou êxito, passou a negociar com Varig a compra de toda a rede de Tropical, que possuía hotéis em Manaus, Santarém, João Pessoa, Salvador, e São Paulo, além do hotel de Foz do Iguaçu.  A negociação teve várias complicações, a começar pelo fato que apenas os hotéis de Manaus e Santarém pertenciam de fato à Tropical, sendo que os outros eram arrendados ou alugados de terceiros.  No final, não foi possível chegar a um acordo com a Varig, e o negócio não foi para frente.  O episódio ainda me rendeu uma experiência interessante pois em dezembro de 1994 fui destacado pelo grupo  Orient-Express, junto com um jovem executivo do grupo sediado em Londres, para realizar um trabalho de “due diligence” em todos os hotéis do grupo Tropical, começando por Manaus, e terminando em São Paulo, numa verdadeira maratona pelo Brasil.  Se para mim, que já conhecia bem o norte e nordeste do Brasil, a experiência foi super interessante, imagina o que foi para o jovem executivo inglês.  Muitos anos mais tarde, este mesmo jovem inglês foi nomeado CEO do grupo Orient-Express, e se habituou a realizar viagens exóticos pelo mundo todo, mas ele sempre me confessava que nada se comparava com a viagem pelo Brasil em dezembro de 1994.
Com o fracasso das negociações com Varig/Tropical, Sherwood decidiu aguardar a próxima licitação para tentar arrendar o hotel, que estava previsto para ocorrer em 1995, mas foi surpreendido com a notícia que o governo havia renovada a concessão com a Tropical sem promover uma nova licitação.  Na verdade, desde o inicio, a concessão vinha sendo renovada há cada dez anos sem que tivesse havida qualquer licitação pública, com o argumento que a principal companhia aérea que atendia Foz do Iguaçu  (no caso, a Varig) estava mais bem posicionada para promover o hotel e “vender” o destino.  É também verdade, que a Varig/Tropical havia investida na ampliação do hotel, construindo dois anexos ao prédio original, a primeira em 1973 e a segunda em 1982.  Mas o Sherwood não foi o sucesso que foi sem ter uma grande dose de determinação, e dez anos depois, já em 2005, lá estava ele de novo indagando ao governo quando é que teria uma nova licitação para o Hotel das Cataratas.  Em 2005, a Varig já não desfrutava do mesmo prestígio de antes, e o próprio Hotel das Cataratas estava exibindo claros sinais de decadência em função do pouco investimento na renovação  do hotel.  Consequentemente, o governo resolveu realizar uma licitação internacional, com o objetivo de entregar o Hotel das Cataratas a um grupo que teria condições de realizar os investimentos necessários para fazer do Hotel das Cataratas uma verdadeira referencia de hotelaria de qualidade e de luxo, tanto no Brasil como no exterior.  Após uma árdua disputa com o grupo Tropical, o grupo Orient-Express foi declarada vencedora da licitação, e finalmente, em primeiro de outubro de 2007, assumiu a gestão do Hotel das Cataratas.  Lamentavelmente, o homem que mais lutou para que este dia chegasse não estava lá para celebrar.  Três meses antes, em junho de 2007, o Board do Orient-Express havia nomeado um novo Chairman, e o James Sherwood passou a ter o titulo de "Diretor e Fundador", mas sem qualquer responsabilidade executiva.  Não obstante estas mudanças na direção da companhia, e apesar das dificuldades financeiras oriundas da crise financeira mundial de 2008 e 2009, o grupo Orient-Express realizou vultosas obras de reforma nos três anos seguintes após ter assumida a gestão da propriedade, e no final de 2010 pode reinaugurar, com muito orgulho, um dos mais belos hotéis do Brasil, e do mundo. De lá para cá, sob a batuta do seu competente diretor, Celso Valle, que está no posto desde 2007, e com a ajuda de sua valiosa equipe, o hotel tem acumulado diversos prêmios nacionais e internacionais, e é reconhecido pelo site da TripAdvisor como um dos hotéis de maior satisfação dos seus hóspedes em todo o continente sul-americano, e é um dos orgulhos do grupo Orient-Express.