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segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

O Copacabana Palace e o Patrimônio Histórico


Apesar de que o plano de construir um segundo Anexo foi abandonado no início dos anos 2000, o episódio ainda rendeu algumas sequelas, algumas das quais perduram até hoje.  Isto porque no final de 1999 a Secretaria de Finanças do Município, com o intuito de confirmar a isenção de pagamento do imposto territorial urbano (IPTU) que todos os prédios tombados desfrutam - desde que adequadamente mantidos - solicitou á Secretária de Cultura um parecer no sentido de confirmar que o Copacabana Palace estava zelando pelo bem tombado de acordo com a sua obrigação.    Para nossa grande surpresa, a resposta da Secretária de Cultura foi negativa, com o argumento que a existência de um projeto de construção de um segundo Anexo, nesta altura já aprovado pela Prefeitura do Rio de Janeiro (embora ainda condicionada a aprovação da Iphan) era uma clara demonstração que o Copacabana Palace não estava respeitando o espirito do tombamento.  Segundo o relator do processo, a existência de um projeto aprovado, mesmo que não realizado, obrigava o Conselho a supor que um dia o segundo Anexo seria construído, e portanto a resposta deveria ser dada presumindo a existência desse novo Anexo.  Diante dessa resposta negativa, a Secretária de Finanças se viu obrigado a cancelar a isenção do IPTU que o hotel até então desfrutava e emitiu novas guias cobrando retroativamente todo o imposto supostamente devido desde 1990, ano em que havia entrado em vigor a isenção.  Tratava-se de um valor altíssimo, e apesar de várias tentativas de encontrar uma solução administrativa para a questão, isto não foi possível, de forma que no final de 2013 a questão ainda está na esfera da Justiça aguardando uma decisão.

De qualquer forma, a perda da isenção do IPTU alertou o hotel para a necessidade de estreitar o relacionamento com o pessoal do Patrimônio Histórico visando estabelecer um melhor entendimento das exigências do Patrimônio, e a partir disso desenvolver um programa de reformas que atendia tanto as exigências do Patrimônio Histórico como do grupo Orient-Express.  Até então, o relacionamento entre o hotel e o Patrimônio Histórico tinha ficando unicamente nas mãos do escritório de arquitetura  inicialmente contratado para assessorar o decorador francês Gérard Gallet, o escolhido do Sherwood para conduzir as reformas do hotel.  A filosofia de trabalho desse escritório era de cuidar das aprovações enquanto as obras iam sendo executadas, mas nem sempre essa filosofia produzia bons resultados.  Depois de várias frustrações, foi realizado uma reunião na Prefeitura do Rio com as pessoas responsáveis pela área de Patrimônio Histórica e o próprio James Sherwood o que resultou num acordo em que o hotel se obrigou a cumprir uma serie de mais de 40 itens exigidos pelos órgãos do Patrimônio Histórico, algumas das quais sendo correções de obras de reforma já realizadas incorretamente pelo Orient-Express. Também se determinou que a partir daquele momento nenhuma obra nova fosse iniciada sem a completa aprovação prévia dos órgãos de Patrimônio Histórico. Com este acordo, foi também reestabelecida a isenção do IPTU para os anos futuros.  Foi a partir desse momento que o hotel contratou o escritório de Lúcia Vieira para administrar a obra, e com o passar do tempo, essa nova filosofia de relacionamento com os órgãos de preservação demonstrou ser extremamente positiva para o hotel, já que os técnicos responsáveis, uma vez convencidos das boas intenções do grupo Orient-Express em relação à preservação do hotel, e satisfeitos por comprovar que o grupo estava cumprindo com a execução das exigências, passaram a atuar mais como conselheiros do que fiscais, o que permitiu que na ultima década o Orient-Express pudesse avançar na reforma do hotel e finalmente concluir toda a reforma sem ferir nenhuma exigência do Patrimônio Histórico.  Não é incomum ouvir criticas em relação às dificuldades de relacionamento entre empresários e os órgãos de Patrimônio Histórico, mas no caso do Copacabana Palace, posso afirmar que o relacionamento foi sempre altamente profissional, e até gratificante, e não é exagero afirmar que se não fosse por eles, o hotel não seria tão bom, nem tão bonito, como hoje é.

terça-feira, 10 de dezembro de 2013

"Niemeyer e o Segundo Anexo"


Uma das consequências da melhoria na taxa de ocupação a partir de 1997 foi a renovação da determinação do James Sherwood em ampliar o numero de apartamentos existentes no hotel.  Desde o advento dos grandes hotéis na orla de Copacabana durante a década de ’70, havia se firmado um concenso que a única maneira de tornar o Copacabana Palace competitivo era de ampliar o numero de apartamentos existentes nos dois prédios que formam o conjunto do Copacabana Palace.  Isto porque, apesar de sua grande amplitude, os dois prédios consistiam de apenas 223 apartamentos na sua totalidade, e isto contrastava negativamente em comparação com os 530 apartamentos do Meridien, os 560 do Rio Othon, os 415 do Rio Palace, e assim por diante.  A família Guinle, antigos proprietários do hotel, haviam apresentado um projeto que consistia na derrubada do prédio principal a sua substituição de uma nova torre que teria 700 apartamentos.  Foi o clamor publico contra este projeto que levou ao tombamento do prédio principal, e o sepultamento de qualquer chance de ampliar o hotel.  Quando James Sherwood adquiriu o hotel em 1989, estava ciente do tombamento, e da necessidade de manter a fachada inalterada, mas achava que mesmo assim poderia ampliar o numero de apartamentos construindo novos apartamentos em diversos espaços ociosos dentro do hotel. Na sua avaliação inicial, o Sherwood considerava que havia espaços suficientes para chegar a 300 apartamentos.  Infelizmente, nenhum dos espaços identificados por Sherwood como possíveis área de ampliação demonstrou ter viabilidade.  Uma das ideias do Sherwood era de construir apartamentos em volta da piscina.  Para isso, ele queria que o muro divisório com o prédio vizinho do Chopin recuasse quatro metros dentro da servidão, ou que, além de ser impossível de aprovar, ainda teve como consequência acirrar os ânimos dos nossos ilustres vizinhos, que levou um bom tempo para serenar.  Outra área de ampliação, segunda a visão do Sherwood, era debaixo do telhado do antigo casino, com apartamentos voltados tanto para a quadra de tênis como para a Avenida N.S. de Copacabana.  Este projeto, assim como outros apresentados, foi sumariamente rejeitado pelo Patrimônio Histórico.  Inicialmente, o Sherwood ficava frustrado em não conseguir ampliar o número de apartamentos, mas na medida em que o tempo ia passando, e a ocupação do hotel mantinha-se baixa, esse entusiasmo de ampliar o hotel foi diminuindo.  No final da década de ’90, entretanto, esse entusiasmo de ampliar o hotel voltou, e desta vez, o Sherwood encontrou na pessoa do então Prefeito da cidade, Luís Paulo Conde, uma pessoa disposta a ajuda-lo.  O Conde, além de Prefeito, era também arquiteto, e antes de ser eleito Prefeito havia sido o Secretário de Obras da cidade.  Um dos dilemas que o hotel enfrentava era o que fazer com os antigos salões do casino, voltados para a Avenida Nossa Senhora de Copacabana, e há muito tempo abandonados.  Eram espaços valiosos, mas que em nada contribuíam para o resultado do hotel.  Com o incentivo do Prefeito, o Sherwood apresentou então um projeto para a construção de um novo prédio - um segundo Anexo - ocupando todo o espaço antes ocupado pelos salões do antigo casino.  Seria um prédio de 16 andares e teria um total de 162 novos apartamentos.  O novo prédio seria integrado ao prédio existente através de uma conexão situada na atual quadra de tênis, de modo que a entrada única do hotel continuaria a ser pela a Avenida Atlântica.  Na minha avaliação, tal projeto, caso fosse concretizado, teria consequências catastróficas para o futuro do Copacabana Palace, pois a ampliação do hotel em mais de 70%, sem nenhuma ampliação das áreas públicas, e com apenas limitadas expansões das áreas de serviço, comprometeriam seriamente a qualidade dos serviços oferecidos.  Além disso, a existência de um hotel de 385 apartamentos obrigaria o hotel a aceitar reservas de segmentos do mercado turístico que fogem da definição de mercado de luxo, com consequências negativas para a imagem do hotel.  Não obstante meus argumentos, o Sherwood demonstrou determinação em seguir adiante com a aprovação do projeto.  O Prefeito Conde se tornou um grande aliado, pois achava que a nova construção iria revitalizar uma área degradada nos fundos do hotel e com a sua ajuda, o projeto foi aprovado tanto na Prefeitura como nos órgãos de Patrimônio Histórico, tanto na esfera municipal, como na esfera estadual.  Porém, quando o projeto chegou ao escritório regional da Iphan no Rio de Janeiro, já na esfera federal, encontrou obstáculos na aprovação que nem o Prefeito Conde foi capaz de superar.  Depois de algum tempo, e muita pressão politica, o projeto saiu do escritório regional no Rio de Janeiro e foi encaminhado para a administração central da Iphan em Brasília, e lá permaneceu sem notícias por vários meses.  Enquanto isso, o Sherwood, em Londres, continuava a fazer lobby para a aprovação do projeto com todos os embaixadores, ministros, e outras autoridades brasileiras que passassem pela cidade.  Este trabalho do Sherwood rendeu frutos, pois após algum tempo, e fomos procurados pelo próprio Presidente da Iphan, que nos disse basicamente o seguinte; Da forma que o projeto se encontrava, seria muito difícil aprova-lo, pois o mesmo já havia saído do Rio “contaminado” por um parecer negativo.  A sugestão do Presidente da Iphan era que devíamos substituir o projeto em aprovação por outro projeto, de autoria do Oscar Niemeyer.  Segundo a ótica do Presidente da Iphan, seria muito pouco provável que um projeto do Niemeyer não fosse aprovado.  Nós disse ainda que ele já havia conversado com Niemeyer sobre este assunto e que Niemeyer concordaria em fazer o projeto, caso fosse convidado.    Levamos então o assunto para Londres, e não demorou muito para vir à resposta, Sherwood concordou em substituir o projeto por outro de autoria do Niemeyer. 

Os subsequentes contatos com Niemeyer foram, no mínimo, folclóricos.  Nesta altura o Niemeyer já estava com 95 anos de idade.  Não obstante isso se mantinha totalmente lúcido e se locomovia bem, embora lentamente.  Na sua primeira visita ao hotel, olhou longamente para a fachada com um olhar contemplativo, e depois de algum tempo se virou para mim e disse “Este prédio é uma m****, jamais devia ter sido tombado!” Não achei prudente explicar que o prédio foi tombado pelo seu significado histórico, não arquitetônico.  Numa outra ocasião, já desfrutando de mais intimidade com o grande homem, perguntei, “O Senhor ainda se identifica como comunista?”, “Comunista não”, veio à resposta “Sou Stalinista, Stalin foi o maior homem do século XX!” O projeto original do novo Anexo que havíamos apresentado contemplava uma fachada com características que harmonizava com o prédio existente.  O projeto de Niemeyer, em contraste, era totalmente o oposto.  Tratava-se de uma fachada totalmente em vidro fumê preto, com apenas a marquise da entrada do Teatro mantido.  De qualquer maneira, o Sherwood gostou do projeto e Niemeyer, invertendo o caminho normal das aprovações, nos disse, “Em 30 dias, eu aprovo este projeto na Iphan em Brasília, depois vocês tratam de obter as aprovações nos níveis estadual e municipal, pois com essa gente, eu não trato”.  Apesar do otimismo do Niemeyer, a resposta da Iphan não vinha. O tempo foi passando, e nada de aprovações.  Finalmente, conseguimos desenvolver um “business plan” e demonstrar para Sherwood que havia um alternativo para os antigos salões do casino, que seria a sua transformação em salões de eventos.   Depois de muitas discussões, o Sherwood aprovou o novo plano e com isso a ideia de construir um novo prédio foi definitivamente sepultada.  No seu livro de memorias, o Sherwood identifica a não concretização do novo prédio como sendo a sua maior frustração,  em relação ao Copacabana Palace, mas também reconhece que os novos salões se tornaram um grande sucesso, e termina dizendo “so who am I to complain?”



segunda-feira, 9 de dezembro de 2013

"Salvo por Wall Street"


Após a conclusão da primeira etapa das obras de reforma, no final de 1996, o Copacabana Palace passou novamente a ter todos seus apartamentos disponíveis para alugar, o que não havia acontecido desde o inicio de 1994.  Embora todos os apartamentos do hotel haviam sidos objetos de algumas melhorias, apenas 30% do total dos apartamentos atendiam a um padrão considerado de luxo de acordo com os próprios padrões do grupo Orient-Express. Isso não deixava de ser um resultado decepcionante, considerando que o hotel já pertencia há sete anos ao grupo Orient-Express, mas, as limitações financeiras do grupo de um lado, e a falta de confiança na viabilidade financeira futura do hotel por outro lado - compreensível após amargurar sete anos de prejuízos operacionais - foram os responsáveis por esta situação.  Contribuiu também a imagem de insegurança que a cidade do Rio de Janeiro desfrutava tanto no mercado nacional como internacional, e a consequente diminuição de turismo de lazer, o carro chefe tanto do grupo Orient-Express como da cidade do Rio de Janeiro. Em 1996, o Copacabana Palace representava uma pesada ônus para o grupo Orient-Express e não faltava quem achasse que a melhor solução seria vendê-lo  na primeira oportunidade.

 Por sorte, a conclusão das obras do hotel coincidiu com uma melhora repentina e inesperada na demanda de hospedagem no Rio de Janeiro, após vários anos de maus resultados na hotelaria carioca, e isso permitiu um crescimento expressivo na taxa de ocupação do hotel, com reflexo imediato nos resultados financeiros.  Este aumento de demanda foi movido quase inteiramente pelo crescimento do mercado corporativo internacional – e mais especificamente, pelos grandes Bancos de Investimento - atraídos pelo sucesso do Plano Real, e do programa de privatizações do Governo do Fernando Henrique Cardoso.  Este aumento de demanda no mercado corporativo durou até o ano de 2001 e permitiu que o hotel apresentasse resultados cada vez melhores, pois não apenas os jovens financistas de Wall Street viajavam constantemente, como gastavam pequenas fortunas em cada viagem. Para se ter uma ideia do impacto desse mercado no movimento do hotel, no ano de 2000, nada menos que 14 dos 20 melhores clientes do hotel eram Bancos de Investimento.  Essa mudança brusca nos resultados do hotel mudou completamente o pensamento do Orient-Express em relação ao futuro do hotel.  Em vez de ser o hotel problema, que atravancava o crescimento do grupo, o Copacabana Palace passou a ser visto como uma grande estrela, capaz de mudar para melhor o próprio destino do Orient-Express. A partir de então, o grupo passou a contemplar novas obras que por fim resultariam num hotel verdadeiramente de categoria de luxo internacional.  Mas antes disso acontecer, ainda teria muita agua a passar debaixo da ponte!

quarta-feira, 22 de maio de 2013

A Chegada do Simon Sherwood

Logo depois da inauguração do Restaurante Cipriani em março de 1994, o hotel fechou o prédio principal para dar início a grande reforma dos apartamentos.  O maior desafio era a necessidade de ampliar o tamanho dos banheiros, já que as exigências do mercado de hotelaria luxo exigia banheiros amplos de mármore, com a banheira separada do chuveiro, uma pia dupla, e acabamentos luxuosos.  Para conseguir isto era necessário substituir toda a instalação hidráulica do prédio e isto só poderia ser alcançado com o prédio fechado.  O hotel passou a funcionar então somente com os 78 apartamentos do prédio do Anexo disponíveis, e o acesso ao hotel era feito somente através da entrada na Avenida Nossa Senhora de Copacabana.  Também não havia nenhum salão disponível para realizar eventos, e, consequentemente, o faturamento do hotel caiu para um nível muito baixo, gerando grandes prejuízos operacionais.  Para dificultar ainda mais o processo de reforma, em meados de 1994 o Sherwood nomeou seu enteado, Simon Sherwood como CEO da companhia.  Em 1994 Simon era um jovem de 34 anos de idade, com graduação pela universidade de Cambridge e pelo Harvard Business School, e que havia trabalhado alguns anos como consultor no Boston Consulting Group antes de entrar no grupo de Sea Containers, inicialmente no cargo de vice-presidente para estratégia.  Ele entrou no Orient-Express com a tarefa de vender os ativos não produtivos, impor rígidos controles financeiros, cortar custos considerados supérfluos, e tentar tornar o grupo, que nesta altura contava com nove hotéis próprios, e mais dois com “management contract”, e mais o trem Venice-Simplon Orient-Express, lucrativo.  A chegada do Simon Sherwood correspondeu a um verdadeiro vendaval dentro da companhia.  Tudo era questionado, e muitas mudanças foram realizadas.  A gestão do Simon a frente da Orient-Express não pode ser considerada nada além de um espetacular sucesso.  Em 1993, a empresa havia lucrado apenas USS1,5M, com ativos avaliados em US$215M.  Já em 1994 o lucro aumentou para USS14M, e cresceu anualmente (com alguns altos e baixos), até no último ano do Simon a frente do Orient-Express em 2007, atingir um lucro recorde de US$155M.    Apesar de todo esse indiscutível sucesso, a chegada do Simon não foi muito bom para o Copa, pelo menos no início. Isto porque em 1994, o Copa representava o maior problema que o grupo tinha.  Havia acumulado grandes perdas desde a sua aquisição pelo grupo em 1989, e agora, com o prédio principal fechado, os prejuízos aumentava cada vez mais.  Para complicar ainda mais a situação, o país Brasil também não andava bem.  Depois do desastre do Plano Collor, e o subsequente impeachment do Presidente, o pais ainda vivia num regime de hiper inflação e nenhum crescimento econômico. O nível de crimes no Rio de Janeiro estava atingindo limites insuportáveis, e o turismo receptivo andava em baixo.  Diante desse quadro negativo, o Simon decidiu restringir os investimentos na reforma ao mínimo necessário para poder reabrir o hotel e, muito provavelmente, concluiu que deveria vender o hotel na primeira oportunidade que surgisse.  Foi assim então que o plano mestre da reforma foi abandonado, e a grande obra de reforma tomou um caminho bem mais modesto.  A partir do início de 1995, os apartamentos do prédio principal foram sendo gradativamente reincorporados a disponibilidade, mas somente em outubro de 1996, após dois e meio de reformas, o hotel passou a contar novamente com todos seus apartamentos disponíveis para venda, muito embora muitos deles não atingiam o padrão esperado de um hotel Orient-Express.  Não obstante isso, a data marcou uma nova era na história do hotel.  A partir desta data o hotel iniciou um longo período de crescimento econômico até se tornar o hotel mais lucrativo do grupo Orient-Express.  Como o Copacabana Palace, o patinho feio que ameaçava a própria sobrevivência do grupo Orient-Express se tornou a “joia da coroa”, é uma história que contarei nos próximos capitulos.

terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

"O Cipriani"


Um dos desafios que tivemos ao assumir a direcao do Copacabana Palace foi de encontrar um novo local para o restaurante principal do hotel, o lendário “Bife de Ouro”.  Embora o restaurante  estava localizado no andar terreo do prédio principal, não havia vista para a praia.  Antigamente havia uma entrada diretamente da Avenida Atlântica, mas apos uma reforma realizada pela família Guinle em 1986, esta entrada tinha sido fechada.  O James Sherwood insistia  que o restaurante tivesse uma vista para a praia de Copacabana, e ele inicialmente determinou que o restaurante ocupasse parte da varanda frontal do hotel.  Quando este plano mostrou ser inviável devido a recusa do Patrimônio Histórico em permitir qualquer construcao permanente nas varandas, ele passou a contemplar utilizar metade do Salão Nobre para o restaurante, e ainda colocar mesas na varanda quando o tempo permitia.  Argumentamos que o Salão Nobre era um espaço muito importante para os muitos eventos realizados no hotel, e a transformacao de metade dele num restaurante permanente iria prejudicar estes eventos, alem de dificultar o acesso ao Golden Room, outro local de grande importância para a realizacao de eventos.  Não obstante estes argumentos, o Sherwood insistia no seu plano e encomendou um projeto para a instalacao do restaurante do arquiteto e decorador francês, Gerard Gallet.  Alguns meses mais tarde, e com o projeto de Gallet para o novo restaurante  já finalizado, tive mais uma oportunidade para abordar a inconveniencia do local escolhido, durante um almoço na Pérgula.  O Sherwood ouviu meus argumentos, sem nada comentar, e quando eu terminei de falar  ele simplesmente apontou para o outro lado da piscina, onde ficava  o Salão Verde, que era ate então a sala de estar do prédio do Anexo, e disse, “Entao faremos o restaurante naquele salão.  Pelo menos terá uma vista bonita da piscina”.  E assim foi feito.  O projeto do Salão Nobre foi abandonado e o novo restaurante do Copa começou a nascer.  O projeto do novo restaurante foi mais uma vez entregue a Gerard Gallet, que teve de imediato uma ideia brilhante, que foi de levantar o piso  do local em aproximadamente 60 centímetros e com isso ganhar uma vista privilegiada da área da piscina.  Quem acessa hoje o restaurante mal percebe que há três degraus logo na sua entrada, mas são exatamente esses três degraus que fazem toda a diferença.  Quando Gallet projetou o restaurante não se sabia qual seria o estilo culinária a ser adotada pelo novo restaurante.  Em principio, seria apenas o novo local para o “Bife de Ouro”.  O “Bife de Ouro”, assim batizado pela magnata das comunicacoes e todo-poderoso,  Assis Chateubriand, numa alusão aos altos preços cobrados, havia sido um dos principais restaurantes da cidade nas décadas de ’40, ’50, e ’60, frequentado assiduamente tanto pela sociedade carioca como pelos políticos e diplomatas estrangeiros numa época em que Rio de Janeiro ainda era o capital da Republica.  A partir da década de ’70 o restaurante entrou num período de declínio e este declínio se acentuava ano a ano. Em 1986, os Guinles haviam feita uma boa e bonita reforma no restaurante, e relançaram o “Bife de Ouro” em grande estilo, incluindo fornecimento exclusivo de carnes  do famoso açougue Wessel de São Paulo.  Esta iniciativa, entretanto, teve apenas um sucesso limitado, e em 1993, enquanto o novo restaurante tomava forma, o “Bife de Ouro” raramente vendia mais que 25 couverts por dia.  Em funcao disso, resolvemos “aposentar” o Bife de Ouro e partir para algo completamente novo.  Queríamos algo clássico, de acordo com o estilo do hotel.  Chegamos a pensar numa culinária francesa, mas logo desistimos pelo razão de já existirem vários ótimos restaurantes franceses na cidade.  De boa cozinha italiana, entretanto, haviam  poucas opcoes, e como o “flagship” do grupo Orient-Express e o Hotel Cipriani de Veneza, logo escolhemos fazer um restaurante com culinária italiana.  Para fazer um restaurante verdadeiramente italiana, eu sabia que teria que contar com o apoio dos nossos hotéis na Itália, e no inicio de novembro de 1993, faltando menos que quatro meses para o novo restaurante ficar pronto,  pus o “business plan”  na bagagem e fui para Veneza solicitar apoio do grande hoteleiro e “gentleman” italiano, Natale Rusconi, Diretor Geral do Hotel Cipriani.  Por sorte, o Rusconi adorou o plano e se dispôs a ajudar.    Designou três pessoas de sua equipe – O Diretor de Alimentos e Bebidas, o sub-Chefe de Cozinha, e o Maitre Executivo – para passaram três meses no Brasil ajudando a montar o restaurante.  O fato do Hotel Cipriani fechar no inverno europeu facilitou este apoio.  Faltaria ainda um Chef permanente para o restaurante, e como não havia ninguém do Hotel Cipriani disponível para assumir este compromisso, Rusconi ficou de recrutar um Chef, treinar-lo, e depois mandar-lo para Brasil.  No inicio de dezembro a equipe italiana chegou no Brasil e começaram logo a trabalhar.  Fizeram algumas alteracoes na cozinha e pesquisaram todos os mercados da cidade para escolher os fornecedores e começaram a montar o cardápio do restaurante.  Em janeiro de 2004, faltando menos de dois meses para ficar pronto, o restaurante ainda não tinha nome.  Tínhamos pensado inicialmente em chamar-lo “Cipriani”, mas nossos advogados haviam nos avisado que não poderíamos usar este nome em funcao de um longo litigio entre a família Cipriani e o Orient-Express sobre o uso do nome.  Pensamos então no nome de “Portofino”, local de um outro hotel da companhia na Itália, mas descobrimos que havia uma pousada em Ubatuba com o registro desse nome, e uma tentativa de um acordo com eles para o uso do nome foi improdutiva.  Preparamos então uma lista com uns dez nomes italianos, a maioria com alguma ligacao a Veneza, e como faltava poucos dias para Sherwood chegar para sua visita anual, resolvemos apresentar a lista para ele e deixar ele escolher o nome.  Quando Sherwood olhou a lista, balançou a cabeça negativamente, e disse, “Vamos chamar o restaurante de Harry’s Bar”  Ninguém achou uma boa ideia, pois para quem não frequenta Veneza, e para quem não ler Ernest Hemingway, a associacao do “Harry’s Bar” com um restaurante italiano não e simples.  Por sorte (?), o nome do Harry’s Bar também estava registrado em nome de uma outra empresa, e quando isto foi informado para Sherwood, ele disse, “Entao vamos chamar o restaurante de Cipriani”.  “Mas e isso que nos queríamos desde o inicio, mas os advogados nos disserem que não podemos utilizar este nome”, eu respondi.  “Podemos sim”, retrucou Sherwood, “fiz um acordo com a família Cipriani e nos podemos utilizar este nome desde que seja em propriedades do Orient-Express”  E assim, o nome Cipriani foi escolhido como nome do novo restaurante.  Quinze dias depois da inauguracao do restaurante, recebi um telefonema do nosso advogado de Nova York, que me disse, “Voces não podem usar o nome de Cipriani para o restaurante, a não ser que seja precedido pelo nome Hotel.  Terão que reimprimir todos os cardápios e notas fiscais, pois  o nome terá que ser Restaurante Hotel Cipriani”.  E assim continua ate hoje.  Na pratica, todos conhecem o restaurante simplesmente pelo nome Cipriani, mas quem prestar atencao ao cardápio, ou a nota fiscal, perceberão que estão frequentando o “Restauranate Hotel Cipriani”!

 

Alem da escolha do nome, houve um outro drama antes da abertura do restaurante.  Faltando vinte dias para a abertura, o Natale Rusconi me telefonou da Itália para dizer que o novo Chefe de Cozinha, que ele havia recrutado e treinado já estava pronto para vir ao Brasil.  Mandamos uma passagem aérea da Varig, e no dia acertado mandamos buscar o Chef no aeroporto.  Para surpresa geral, o Chef não apareceu. Pensávamos que devia ter havido algum desencontro no aeroporto e logo o Chef apareceria, mas nada.  Ligamos para Natale Rusconi na Itália, e ele confirmou que o Chef havia saído de Veneza há dois dias com a passagem para o Brasil no bolso.  Onde estava o Chef?  Três dias depois ele reapareceu em Veneza.  Contou que pegou o avião da Varig para Brasil, conforme combinado, e ficou sentado ao lado de dois outros italianos que vinham passar ferias no Brasil.  Durante o voo, este dois turistas teriam abusado do consumo de bebidas alcoólicas e em determinado momento passaram a se tornarem inconvenientes, inclusive dirigindo gracejos para as aeromoças.  Quando o avião posou no Rio de Janeiro,  subiu a Policia Federal a bordo e prendeu os três,  apesar que o Chef jurou que ele estava inocente, e nada tinha a ver com o comportamento dos dois turistas.  De qualquer maneira, as explicacoes do Chef não convencerem a Policia Federal, e o fato e que os três foram mantidos presos durante o dia e a noite despachados de volta para Itália no mesmo avião que os trouxe.  Faltava quinze dias para o restaurante abrir, e não tínhamos um Chef, e não havia tempo suficiente para recrutar e treinar outro.  Telefonei para Rusconi e lhe disse, “ Natale, eu já tenho a solucao.  O seu sub-Chef, Francesco Carli, já esta aqui há três meses e esta adorando o Brasil, e ele aceita ficar.  Ele e um ótimo Chef e com certeza sera um grande sucesso”  “Mas eu não posso abrir mão de Carli” me falou Rusconi, “ele e importante demais aqui no Hotel Cipriani”  “Mas Natale” eu argumentei, “falta apenas quinze dias para o restaurante abrir, que outra opcao nos temos?”   A contra-gosto, o Natale concordou que de fato não tínhamos outra opcao e pesarosamente, abriu mão do passe do Francesco Carli.  Passado quase vinte anos, Francesco Carli continua trabalhando no Copacabana Palace.  Depois de ficar 15 anos como o Chef do Restaurante Hotel Cipriani, durante o qual o restaurante recebeu todos os prêmios possíveis pela excelência de sua cozinha, Francesco Carli e hoje o Chef Executivo do hotel, responsável pela organizacao e supervisão de quase uma centena de cozinheiros trabalhando nas três cozinhas do hotel.  Quanto ao Restaurante Hotel Cipriani, foi um sucesso desde a sua abertura em marco de 1994, e ate hoje 75% dos seus frequentadores são moradores da cidade e não hospedes do hotel.  Desde a abertura, o local já passou por duas reformas, a ultimas das quais em 2011, que acrescentou um “Chef’s Table”, que possibilita que os clientes jantem enquanto observam o movimento normal da cozinha.  Hoje a decoracao do restaurante reflete o estilo veneziano de sua cozinha, hoje sobre o comando de outro talentoso Chef italiano, Nicola Finnamore.  Para os saudosistas do antigo “Bife de Ouro”, uma revelacao.  As poltronas do Cipriani  ainda são as  mesmas do antigo Bife de Ouro, obviamente, re-estofadas.

segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

A Quadra de Tenis e Outras Obras


Um dos problemas que enfrentamos quando adquirimos o hotel em 1989 era a confusa ligacao entre o prédio principal e o Restaurante Pérgula, que era um corredor estreita e sinuosa que iniciava ao lado do Concierge e passava em frente ao Central Telefônico, e ao lado do Restaurante Bife de Ouro, ate chegar defronte da entrada do Bar do Copa e do Restaurante Pérgula, e dai para a piscina do hotel.  Os hospedes, por sua vez, para acessar a piscina, desciam nos elevadores para o sub-solo, e dai passavam num corredor de serviço que dava acesso a cozinha central, ate chegar no “Balneario”, e dai acessar a piscina.  O Sherwood estava determinado a encontrar uma solucao melhor e encomendou aos architectos um projeto que visava ter um corredor ligando o prédio principal diretamente a piscina.  Para viabilizar este novo corredor na área social foi preciso rebaixar o corredor de serviço e criar um novo acesso de serviço para a cozinha.  Foi uma obra difícil e custoso, mas a melhoria na circulacao para os hospedes foi notável, e hoje em dia e difícil imaginar o Copa sem este corredor.   Uma das consequencias da obra e que inviabilizou o acesso dos hospedes a piscina através do sub-solo. Inicialmente pensou-se em criar um elevador exclusivamente para os banhistas, mas mais tarde esta ideia foi abandonada por questões de “economia”, mas o poco do elevador continua la.

Uma outra “obra” que o Sherwood estava determinado a realizar foi a construcao de uma quadra de tênis no telhado do prédio do teatro, e que e acessado a partir do primeiro andar do prédio principal.  A contrucao dessa quadra exigia um grande investimento em relocacao dos torres de resfriamento de ar condicionado, tubulacoes,  e diversos outros equipamentos pesados para liberar a área necessária para a quadra.  Alem disso, tinha que  reforçar a estrutura em todo a área.  Nada disso entretanto detinha Sherwood.  A quadra seria construída, custe o que custar, e foi isso que aconteceu!  Me lembro que o orçamento original para a construcao da quadra era de US$250 mil, e quando o custo real passou de US$600 mil, os engenheiros responsáveis passaram a contabilizar o custo em outra conta,de forma que ninguém sabe ao certo qual foi o custo real.  De qualquer forma, a quadra ficou muito boa, embora pouca utilizada pelos hospedes do hotel.  Numa inspeccao das obras realizados no hotel alguns meses apos a inauguracao da quadra, o Sherwood e outros diretores de Londres admiravam a quadra quando o Diretor Financeiro do grupo virou para mim e perguntou  “tem muita gente que Joga?”.  Antes que eu pudesse  responder o Sherwood fuzilou o diretor com seus penetrantes olhos azuis e lhe disse, asperamente, “That’s not the point!!!”  Depois disso, sempre que alguem me fazia esta mesma pergunta, eu respondia “That’s not the point!”, e o fato e que o Copacabana Palace e o único hotel em Copacabana/Ipanema/Leblon que possui uma quadra de tênis.  That’s the point!  Recentemente, a quadra foi utilizada  para um torneio de veteranos da ATP, com a participacao de Mats Wilander, Thomas Enqvist, e Henri Leconte, entre outros, e isto criou uma mídia muita boa e positiva para o hotel.    Boa parte da imprensa especializada de tênis se referia a "nova" quadra do Copacabana Palace, mas a verdade e que a quadra já existe há mais de 20 anos.




quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

O Baile do Copa


O ano de 1993 acabou sendo marcante na historia do Copacabana Palace porque foi o ano em que o hotel voltou a realizar seu famoso baile de carnaval, apos um intervalo de 20 anos.  Eu tinha tido vontade de reeditar o Baile em 1990, logo apos que o Orient-Express adquiriu o hotel, mas havíamos cancelado o evento apos ter sido informado que o James Sherwood e todo o Board do Orient-Express (junto com seus acompanhantes) viriam passar o carnaval de 1990 no Rio.  Organizar uma reunião de Board, e entretener-los durante uma semana, durante o carnaval carioca, já seria um “baile”.  No final de 1992 entretanto, fui procurado por Sydney Pereira,  com quem eu havia trabalhado no Rio Palace, onde Sydney atuava como Diretor do Chez Castel  (depois Palace Club), que sugeriu reeditar o Baile, com Sydney atuando como organizador e “promoter”.  Antes de concordar, pesquisei tudo que podia sobre os antigos bailes do Copa.  Conversei com Dna. Mariazinha Guinle, para saber porque os antigos bailes tinham acabado.  Ela me disse, “Apos o Baile de 1973, jurei nunca mais realizar um baile de carnaval.  O baile havia virado uma bagunça sem limites, quase sem controle, e ainda provocava um enorme prejuízo financeiro para o hotel”.  Naquele tempo, o Baile ocupava todos os salões do hotel, incluindo os salões do antigo cassino, e a entrada do Baile era pela entrada do teatro na Av. N.S. de Copacabana.  Vendiam  3000 mil ingressos, e ainda haviam centenas de “penetras” que conseguiam furar o sistema de segurança e entrar de graça.  Conversei com várias outras pessoas – mais entendidos no assunto do que eu – e todos foram unanimes.  O tempo dos grandes bailes de carnaval havia passado.  Não havia mais espaço para um baile de gala, quanto mais com a exigência de traje a rigor ou fantasia de luxo.  Mesmo com as opiniões contrárias, resolvemos tentar.  Como a tao esperada reforma do hotel estava demorando, o hotel precisava criar um fato novo que o colocava em evidencia, e reeditar o famoso baile de gala era uma boa oportunidade.  Desde o começo tínhamos algumas conviccoes, que se mantem ate hoje, que são;   1)  Respeitando a tradicao, o Baile seria realizado no sábado de carnaval,  2)  A exigência de traje a rigor,  3)  Limitar os ingressos para 1500 pessoas, ocupando apenas os salões frontais,Salão Nobre, e Golden Room,  4)  Acessar o Baile pela Avenida Atlântica, em vez da Avenida N.S. de Copacabana, e 5) Proibir a presença das emissoras de televisão no Baile.

Com esta orientacao, o Sydney Pereira se pôs a trabalhar, contratou decorador, orquestra, escola de samba, sistema de som, etc. e finalmente no dia 20 de fevereiro de 1993, renasceu o famoso Baile do Copa.  Considerando tudo, foi um sucesso!  Conseguimos vender quase 800 ingressos, e com mais 400 convidados, o salão do Golden Room se manteve animadissimo ate a madrugada.  Embora algumas pessoas foram barradas na porta por não estarem respeitando o “dress code”, a grande maioria dos presentes entraram no clima de um carnaval de gala.  Terminado o evento, verificamos que o Baile havia produzido um pequeno lucro que doamos (como havíamos prometido) a uma instituicao de caridade. O “lucro” real do hotel foi na imensa cobertura que o evento teve na imprensa, que foi muito alem de que nos tínhamos imaginados.

Com tudo que havíamos aprendido durante a organizacao do Baile, estávamos confiantes que o Baile de 1994 seria melhor ainda.  A Hildegard Angel, a influente colunista social que desde o inicio havia apoiada a realizacao do Baile, me telefonou dando algumas sugestões de como o Baile poderia ser melhorado.   Uma das sugestões da Hilde era de contratar Zeka Marquez, para cuidar da decoracao, e a subsequente incorporacao do Zeka a equipe trouxe logo uma nova dimensão para o Baile.  O Zeka não apenas cuidava da decoracao.  Ele criava um tema especifica para o Baile e toda a decoracao seguia este tema.  Alem disso, ele se envolvia em todos os detalhes da organizacao da festa, criando um “happening” permanente no palco do Golden Room.  A decoracao, luxuosíssima, foi estendida para as varandas frontais do hotel, e foi criada uma nova entrada para a festa, ao lado da Pergula,  com tapete vermelho, holofote, etc., que mais parecia uma producao hollywoodiana. Alem disso, toda a fachada do hotel era iluminada com figuras coloridos combinando com o tema da festa.  Por tudo isso, nao e nenhum exagero afirmar que a realizacao do Baile de 1994 foi -  em todos os aspectos -  muito superior ao Baile de 1993, com uma única e importante excecao, a venda de ingressos.  Já que o Baile de 1993 havia vendido quase 800 convites, e teve uma repercussão favorável, imaginávamos que o Baile de 1994 deveria vender por volta de 1000 ingressos, ainda mais com a expectativa criada pela vinda de Zeka.   Infelizmente nao foi o que ocorreu.   Para cobrir os custos adicionais associados a vindo do Zeka, havíamos aumentado moderadamente os preços em relacao ao Baile de 1993, mas a verdade e que o Baile de 1994 teve apenas 99 pagantes,um fracasso monumental de venda!!!!   Nos dias que antecederem o Baile, e já percebendo o fracasso da venda, e claro que convidamos centenas de pessoas para a festa, de forma que, para quem estivesse no Baile, foi um sucesso absoluto.  O difícil foi explicar depois para a Diretoria do Orient-Express em Londres o motivo do rombo que o Baile provocou nas contas do hotel.  O hotel já nao andava bem por forca da crise que a cidade toda atravessava no inicio da década de ’90, e, no caso do Copa, isto era agravada pela falta de reforma dos apartamentos.  Para os ingleses, que nao entendiam muito sobre o carnaval do Rio, e muito menos sobre a tradicao e a importância histórica do Baile do Copa, os gastos com a realizacao do  Baile de 1994 devem ter sido parecidos  com que os republicanos brasileiros achavam dos gastos do ultimo baile da Ilha Fiscal, em 1889!

De qualquer maneira, os ingleses acabaram por aceitar as explicacoes, mas se meu emprego a frente do Copa algum dia correu serio risco, este foi certamente o dia.  Pela logica, o Baile de 1994 devia ter sido o ultimo.  Uma boa ideia, que infelizmente nao deu certo, como, alias, a grande maioria previa.  Resolvemos entretanto insistir com o Baile.  A experiência tinha servido para nos convencer que era viável realizar um baile de grande categoria, que poderia se tornar auto-sustentável.  Para viabilizar o Baile de 1995, convencemos os ingleses que o Baile era uma importante ferramenta de marketing, mesmo que fosse produzir um prejuízo financeiro.  Passamos então a incluir no Budget de Marketing uma verba para cobrir eventuais prejuízos, e tratamos de dobrar o esforco de venda contratando Ana Maria Tornaghi para trabalhar junto com Sydney Pereira na promocao do Baile.  A vinda de Ana Maria trouxe tambem inovacoes importantes que ajudaram a melhorar ainda mais o Baile.  Novamente, o  Baile de 1995 foi um grande sucesso de realizacao, e as vendas melhoram consideravelmente.  Em 1997 o Sydney Pereira se retirou da organizacao, permanecendo Ana Maria como única “promoter” do Baile, ficando assim ate o ano 2000 quando o hotel assumiu diretamente todas as facetas de sua organizacao, incluindo a promocao.  Ao longo dos últimos anos o Baile tem alcançado resultados impressionantes, e já fazem muitos anos que nao se aloca nenhuma verba de marketing no "budget" do hotel para cobrir eventuais prejuízos.  Hoje, nao e incomum ver o Baile produzir um lucro financeiro 10 vezes superior ao prejuízo de 1994.  Os ingleses, obviamente, ficam encantados, como, alias,  eu também fico.  Quem te viu, e quem te ve!  Um evento que lutei tanto para manter vivo,   e que se tornou um sucesso tao grande que, como eu dizia para minha equipe do Copa, nao dava mais  para eu acabar, nem que eu quisesse.  O Baile do Copa  - um verdadeiro”case” de sucesso!

quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

Obras e Mais Obras


Terminada a agitacao do Rio-92, o hotel  voltou a sua rotina normal, mas o movimento continuava fraco e as reformas não saiam do papel, por falta de financiamento.  O decorador francês, Gerard Gallet, havia terminado seu “master plan” da reforma, mas o orçamento para executar-lo era astronômico, muito acima dos valores vislumbrados inicialmente por James Sherwood, o Chairman do grupo.  Sucedeu então uma serie de discussões com os projetistas, e  isto resultou numa grande reunião em Londres com a presença do Sherwood quando a empresa contratada para administrar a reforma, Bovis International, fez um detalhado relato demonstrando as falhas no projeto de Gallet e sugerindo modificacoes que reduziriam substancialmente os custos da pretendida reforma, sem prejuízo para a qualidade ou requinte que se pretendia alcançar.  Não adiantou nada.  Sherwood ficou furioso com a tentativa de modificar um projeto no qual ele mesmo havia tido um grande “input” e o único resultado concreto da reunião foi a destituicao da Bovis como “project managers”, e a nomeacao de novos executivos do grupo para tocar a reforma do hotel.  Ate então, os responsáveis pelo investimento nas reformas eram os executivos da Sea Containers , já que o hotel pertencia ao Sea Containers, mas apos esta reunião Sherwood encarregou os executivos do Orient-Express de cuidar diretamente da reforma, e determinou que as obras se iniciassem com recursos próprios, começando pelo quinto andar do prédio principal. A ideia era de começar pelo quinto andar e depois de vir descendo andar por andar ate completar todo o prédio principal, já que o andar mais alto – o sexto - era ocupado por apenas dois apartamentos – a Suite Presidencial, e a residencia de Dna. Mariazinha Guinle, que pagava um aluguel anual de US$80mil para continuar morando no hotel  apos a vendo  para Sea Containers em 1989.  A nova equipe contratou então um novo “Project Manager”, desta vez uma empresa brasileira, e apos um processo de licitacao, entregou a primeira fase da obra a construtora OAS, e a reforma dos apartamentos finalmente começaram.   A reforma do quinto andar não se tratava propriamente de uma reforma, a palavra reconstrucao seria mais apropriada.  Isso porque dentro das modificacoes pretendidas era a ampliacao do tamanho dos banheiros, que chegavam a ter o dobro e, em alguns casos, ate o triplo do tamanho original.  Isso obrigava a um novo arranjo de todos os espaços, e o resultado e que o quinto andar teve todos os paredes internos demolidos.  Me recordo visitando as obras nesta ocasião e constatando que do antigo andar somente ficou as colunas e os pilares!  Neste trabalho inicial constatou problemas na estrutura do prédio e isso resultou na necessidade de fazer um reforço em toda a estrutura, obviamente encarecendo todo o trabalho.  Mesmo assim, apos vários meses de trabalho, o novo quinto andar foi tomando forma.  O contraste com o resto do hotel não poderia ser maior, tanto quanto diz respeito ao estilo da decoracao, como no luxo, modernidade, e tamanho dos novos banheiros.  Para diferenciar-lo do resto do hotel, o andar foi designado o “andar executivo”, ou “concierge floor”, e passou a ter preços diferenciados em relacao ao resto do hotel. Havia também um “business lounge” no andar que servia tanto como um business center e a noite servia canapés e drinks gratuitamente para os hospedes daquele andar.  Logo apos o andar ter ficado pronto ocorreu um fato triste, que teve consequencias importantes no rumo das reforma do hotel, que foi o falecimento, em abril de 1993, de Dona Mariazinha Guinle, viúva do Fundador do hotel, Octávio Guinle, e moradora do sexto andar.  O falecimento de Dona Mariazinha abriu perspectivas para uma ampla reforma do sexto andar, e James Sherwood incumbiu Gallet de desenvolver um projeto de reforma e ampliacao daquele andar.  No final, Gallet produziu um projeto que contemplava a construcao de onze suites de luxo, sendo seis deles de frente com vista para a Avenida Atlântica, uma delas lateral com frente para a Rua Rudolfo Dantas, e quatro de fundos, com vista para o prédio do Teatro.  Compunha o conjunto uma piscina privativa, com uso restrito para quem estivesse hospedado no sexto andar.  O custo dessa obra foi astronômico, suficiente para reformar os quatro andares do hotel que ainda não tinham sido reformados, mas o Sherwood preferiu apostar no sucesso do sexto andar, e mandou executar o projeto.  Mais tarde, com os custos crescendo cada vez mais, decidiu limitar as novas suites aos seis frente mar e o lateral para Rodolfo Dantas, num total de sete unidades, sendo os quatro restantes pendentes para o futuro.  Mesmo hoje, quase 20 anos passados, e mesmo apos esta ultima reforma do prédio principal, recém concluído, esses quatro suites ainda continuam pendentes. Apesar de tudo, mesmo considerando o custo exorbitante para construir-lo, o sexto andar foi um grande sucesso, pois proporcionou ao hotel instalacoes espetaculares que permitiu receber Reis, Rainhas, Presidentes, Astros de Hollywood, e celebridades diversos, alem de pessoas normais celebrando ocasiões especiais numa ambiente iniqualavel.  Alem disso, criou uma imagem positiva do hotel que serviu para divulgar o nome do hotel, mesmo que boa parte do hotel ainda nao apresentava condicoes dignas da fama e reputacao do hotel.


quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

Annie Phillips e o Rio-92


Outro evento que movimentou o hotel, e a cidade inteira, foi a realizacao do Eco-92, ou Rio-92 como ficou mais conhecido, a mega conferência mundial para discutir o meio ambiente.  Era um evento em que participou quase duzentos delegacoes, incluindo a presença nos dias finais da conferência de 150 Chefes de Estado.  A organizacao foi exemplar, em todos os sentidos, e o evento foi considerado um grande sucesso.  O contraste com a organizacao do Rio+20, realizado no ano passado – e que foi um verdadeiro fiasco, pelo menos no que diz respeito a hospedagem das delegacoes - não poderia ter sido maior.  Mas enfim, voltando para 1992, o desafio do Copacabana Palace era de hospedar 14 Chefes de Governo, ou de Estado, simultaneamente.  Hospedar um Chefe de Estado não e uma tarefa difícil para o Copa, pois não existe hotel no Brasil com mais experiência nesta areá, mas hospedar 14 ao mesmo tempo, e ainda sem ter iniciada a necessária reforma das instala coes, era um grande desafio.  Assim que a conferência foi anunciada, os britânicos reservaram 60 apartamentos no hotel, incluindo a suite Presidencial para sei Primeiro Ministro, na época John Major. Depois vieram as outras delegacoes, todos desejando o melhor apartamento do hotel para seu Presidente ou Primeiro  Ministro.  O hotel ia atendendo a todos na melhor forma possível.  A maior dificuldade foi quando a delegacao da China exigiu hospedar seu Primeiro Ministro na Suite Presidencial, não aceitando que o seu Primeiro Ministro ficasse numa categoria  de apartamento inferior ao Primeiro Ministro Britânico.  Por sorte, o prédio do Anexo também tinha seu suite Presidencial e foi la que hospedou-se o Primeiro Ministro chines.  Faltando menos de 30 dias para o evento começar, e com tudo já resolvido,fui procurado pelo Embaixador de Marrocos, implorando que encontrássemos uma suite  para hospedar o príncipe-herdeiro de Marrocos - hoje Rei Mohammed VI – que havia anunciado de ultima hora que viria representando seu pais.  O embaixador explicou que era uma questão de honra que o futuro Rei se hospedasse no melhor hotel da cidade.  Finalmente conseguimos uma suite no primeiro andar do hotel, que foi inteiramente reformada e redecorada num prazo recorde, tudo por conta da Embaixada.  No final,o resultado ficou deslumbrante, e o futuro Rei ficou satisfeito com sua hospedagem.  Terminado o evento, toda a mobilia do apartamento foi desmontantada e enviada para a Embaixada de Marrocos em Brasília.

Para o hotel, o maior legado do evento foi a descoberta do talento de Annie Phillips para cuidar do setor de “Guest Relations”, um departamento ate então inexistente no Copa.  E que Annie, uma senhora inglesa radicada há muitos anos no Brasil, e, entre outras coisas, ex-dona do Lord Jim Pub em Ipanema, havia sida contratada um ano antes para cuidar do chá da tarde, servido no restaurante Pérgula.  Com a presença no hotel da macica delegacao britânica durante o Rio-92, foi preciso montar um esquema especial de atendimento, e a Annie foi incumbida disso.  O sucesso foi tanto que, terminada o evento, a Annie foi nomeada Diretora de Guest Relations e durante quase 20 anos chefiou um dos mais bem sucedidos setores do hotel.  Durante este tempo a Annie formou dezenas de talentosos jovens,muitos dos quais tiverem sucesso tanto dentro como fora do hotel, e se tornou uma lenda viva dentro do mundo do Orient-Express.  Ate hoje ela continua trabalhando no hotel ensinando inglês aos funcionários.