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terça-feira, 19 de agosto de 2014

O Bar do Copa

Voltando um pouco na história das reformas do Copacabana Palace, a construção do luxuoso Spa do Copa, realizado ao longo do ano de 2007 e inaugurado no ínicio de 2008, permitiu a transferência do Fitness Center do local que ocupava ao lado da piscina para o espaçoso sub-solo do prédio do Spa.  Esta transferência do Fitness Center abriu a oportunidade para revindicamos a volta do outrora famoso “Bar do Copa”, que havia sido extinto desde 1991, quando se criou o novo corredor de acesso ligando o prédio principal à piscina, e dos banheiros sociais que atendem ao restaurante Pérgula.  Desde então, o Copa não tinha tido um tradicional bar de hotel, embora quem quisesse tomar um drink tinha a opção de utilizar a área externa da Pergula, ao lado da piscina. A abertura do restaurante Cipriani em 1994, com um bar acoplado ao restaurante supriu parcialmente esta falta, mas alguns clientes ainda reclamava da falta de um bar tradicional.  O maior problema que tínhamos para realizar este desejo era de convencer James Sherwood que um bar poderia ser rentável.  Por alguma estranha razão, o Sherwood estava convencido que todos os bares de hotéis eram deficitários, e era muito difícil convencê-lo do contrário.  Por sorte, um ano antes, o hotel do Orient-Express em Cape Town, o Mount Nelson, havia montado um moderno “champagne bar” que tinha virado um grande sucesso na cidade, atraindo para o mais tradicional hotel da cidade um público mais jovem.  Foi justamente utilizando o exemplo bem sucedido do Mount Nelson que conseguimos convencer Sherwood  que um novo Bar no Copa seria viável, e assim o projeto foi adiante.  Como sempre acontecia nos projetos de reforma, foi o Sherwood que pessoalmente determinou quem seria o decorador responsável pelo projeto, e ele indicou Graham Viney, o mesmo decorador sul-africano que havia projetado o Bar do Mount Nelson.  Estavamos em junho de 2007, e o Sherwood estava há poucos dias de deixar o comando do grupo, portanto o Bar do Copa acabou sendo o ultimo projeto do grupo Orient-Express diretamente influenciado por ele.   Mesmo com o sinal verde de Sherwood, ainda havia um caminho longo pela frente até definir todos os detalhes do projeto e obter as licenças da prefeitura e do patrimônio histórico, mas finalmente as obras foram iniciadas em meados de 2008, e concluídos no primeiro trimestre de 2009.

Quando o Bar do Copa abriu para o público, era de longe o mais sofisticado e requintado bar da cidade.  Com um investimento de R$4 milhões, e decoração arrojada, ocupava um espaço de aproximadamente 250 metros quadrados.  Um dos pontos altos da decoração foi o teto com milhares de lâmpadas led que imitavam as estrelas no céu do hemisfério sul, mas o que mais chamava atenção era o enorme balcão de mosaico de vidrotil dourado com tampo de ônix iluminado, que ocupava toda o parede de fundo do local.  Além disso, haviam pilares iluminados que mudava de cor, lustres sputnik, e um tratamento acústico com estrutura box-in-box.  O requinte não ficava limitado à decoração, pois toda o material operacional, dos copos aos talheres aos uniformes dos funcionários – estes escolhidos à dedo – eram de linhas exclusivos.  O cardápio de drinques era também sofisticado, com os drinques levando os nomes de personalidades que haviam se hospedado no hotel, como Rita Hayworth, Brigitte Bardot, Carmen Miranda, Mick Jagger, etc.   Havia também um cardápio de tapas preparadas especialmente pelo famoso Chef do Cipriani, Francesco Carli, e servidos em pratos dourados que combinava com a decoração.  Havia também uma programação musical, com apresentações de shows com artistas brasileiros e ocasionalmente estrangeiros, e após meia-noite, entrava um DJ com música mecânica para dançar.  O objetivo era de atrair um público refinado, primordialmente na faixa etária entre 35 e 55 anos de idade, além dos hóspedes do hotel.  Na prática, não foi nada disso que aconteceu.  Após cinco ou seis meses de funcionamento, e não obstante todos os esforços promocionais agendados, já tínhamos a clara visão que o público alvo não iria atender às nossas expectativas.  Em contrapartida, o público jovem, com idade inferior a 25 anos, passou a lotar a casa, principalmente nos finais de semana.  É claro que este público jovem não estava muito interessado em ouvir boa música popular brasileira ao vivo, e nem tomar drinques sofisticados, eles vinham para dançar e ouvir os DJ’s da moda tocar os últimos sucessos, e tomar vodka com Red Bull, para animar a noite.  Não era nada disso que queríamos, mas por um outro lado, precisávamos recuperar o investimento feito na construção do Bar, e resolvemos re-estruturar todo o funcionamento do Bar, que passou a funcionar basicamente de quinta-feira a sábado, de meia-noite às 5 horas da manha, para um publico essencialmente jovem, que pagava ingressos na porta para entrar.  Embora distante do nosso “business plan”, este modelo de funcionamento demonstrou ser altamente lucrativo, de modo que já em 2011 haviamos recuperado todo o investimento inicial.  Foi quando comunicamos à matriz da companhia em Londres que teríamos de encontrar uma nova função para o Bar do Copa, que em vez de ser um sofisticado lounge bar para ouvir boa música brasileira havia se transformado numa casa noturna para quase-adolescentes, criando um conflito insolúvel com a marca  Copacabana Palace.  O Bar da Copa, para alívio de muitos na direção do hotel, finalmente fechou as portas para o público no início de 2013, para dar lugar às obras de instalação do restaurante pan-asiático Mee, inaugurado em fevereiro de 2014.  Pode ser que o novo restaurante não seja tão movimentado quanto foi o Bar do Copa, e possivelmente nem tão lucrativo também, mas certamente tem muito mais a ver com o público que frequenta o Copacabana Palace.  E quanto a um tradicional Bar para o Copa,  será que o James Sherwood tinha razão desde o começo?

segunda-feira, 4 de agosto de 2014

A Crise Financeira de 2008

A crise financeira mundial de 2008, que teve como fato mais dramático o pedido de concordata do conhecido banco de investimentos americano Lehman Brothers teve imediatas consequências  para o grupo Orient-Express.  Embora no ano como um todo o grupo ainda apresentou um lucro operacional de US$125M, o ultimo trimestre do ano tinha sido uma perda total, e as vendas no primeiro trimestre de 2009 demonstraram uma queda de 22% sobre  o mesmo trimestre de 2008.  As ações do grupo na bolsa de Nova York despencaram para níveis jamais vistos provocando uma enorme erosão de riqueza para os acionistas.  Mais grave ainda era o fato que a dívida de Orient-Express com os bancos andava por volta de US$800 milhões, pois era através de empréstimos bancários que o grupo financiava seu crescimento.  Até então esta dívida era considerada compatível com o tamanho da companhia, levando em conta seus ativos e expectativas de lucros operacionais, mas agora, com os bancos sofrendo um crise de liquidez, os bancos  passaram a exigir uma redução nas linhas de crédito.  Mas com os lucros em queda livre e as operações hoteleiras não produzindo o cash-flow necessário, de onde viria o dinheiro?  Diante da situação crítica, o Board do Orient-Express tomou a única opção disponível que era de vender alguns dos seus hotéis, principalmente três ou quatro dos hotéis menores, mas também incluindo hotéis mais conhecidos como o Lapa Palace em Lisboa, e o Windsor Court em New Orleans.  Felizmente, foi possível encontrar compradores para todos eles, mesmo num mercado recessivo.  De todos os hotéis vendidos, o que provocou mais tristeza foi a venda do Windsor Court em New Orleans.  Com seus 300 suites, o Windsor Court era um dos maiores e mais luxuosos hotéis do grupo e durante boa parte da década de ’90 tinha sido o hotel mais lucrativo da companhia.  Em vários ocasiões o hotel havia sido escolhido como o melhor hotel dos Estados Unidos, na pesquisa anual realizada junto aos seus leitores pela prestigiosa revista Conde Nast Traveller e era de longe o maior símbolo da marca Orient-Express no mercado americano.  Infelizmente, entretanto, a cidade de New Orleans tinha sido duramente castigada pela catastrófica inundação sofrida após a passagem do furacão Katrina em 2005, que obrigou a cidade a ser evacuada pelos seus moradores e provocou prejuízos estimados em mais de US$100 bilhões.  O prejuízo para o hotel foi tanto que mesmo quatro anos depois, o Windsor Court ainda era uma mera sombra do hotel que um dia tinha sido.   Como não podia deixar de acontecer, aqui no Brasil havia muita especulação quanto a possível venda do Copacabana Palace, e mal passava uma semana que não havia alguma nota publicada na imprensa neste sentido, sempre desmentida pelo Orient-Express. Como Paul White, o CEO da companhia me assegurava “Prefiro vender a companhia inteira do que vender o Copacabana Palace”.  É que o Copacabana Palace, junto com o Cipriani de Veneza, e o Grand Hotel Europa de São Petersburgo eram os hotéis mais lucrativos da companhia, e além disso são considerados ícones mundiais e com isso agregavam valor aos demais hotéis do grupo.  Felizmente, nunca foi preciso vender nenhum dos “flagships”do Orient-Express, pois além de vender alguns hotéis, o grupo ainda levantou mais de US$400 milhões lançando mais ações no mercado acionário com preços variando entre US$5 e US$10,  diluindo os demais acionistas no processo.  No final, a companhia estava salva, e continuava independente, mas o custo tinha sido pesado.

Enquanto a matriz de Orient-Express e boa parte da companhia estavam mergulhadas numa crise sem precedentes, o Copacabana Palace continuava de vento em popa como se nada estivesse acontecendo.  O lucro operacional em 2008 bateu um novo recorde, chegando a US$15,3M, um aumento de 15% em relação ao ano anterior, e mesmo em 2009, quando o hotel apresentou um ligeiro recuo no lucro operacional para US$14,5M, o “performance” do hotel foi de longe o melhor entre todos os hotéis da companhia.  A razão principal para estes resultados excepcionais era o aumento expressivo no número de hóspedes brasileiros, que mais que compensavam a redução de hóspedes europeias e americanos, aliado ao excelente movimento do departamento de alimentos e bebidas.  Em hotelaria, é rara que a receita de alimentos e bebidas atinge 50% da receita de hospedagem, mas no Copacabana Palace, em 2009, a receita de alimentos e bebidas representou 86,5% da receita de hospedagem.  Se as coisas já andavam bem para o Copacabana Palace, logo iriam melhorar mais ainda, com o anuncio, em outubro de 2009, que a cidade de Rio de Janeiro havia vencida a disputa para sediar os Jogos Olímpicos de 2016.  O efeito positivo deste anuncio para a hotelaria da cidade foi instantâneo, com um imediato aumento na demanda de hospedagem, principalmente vindo do mercado interno.  Com tantas notícias positivas, não é de estranhar que o Board do Orient-Express continuava a aprovar nossos planos de investimento.  Em janeiro de 2009 já havíamos inaugurados o “Bar do Copa” e durante o primeiro semestre de 2009 reformamos e modernizamos totalmente os apartamentos de fundo do Anexo, ampliando o hotel em mais 20 apartamentos no processo.  Em junho de 2009, o Board de Orient-Express realizou uma reunião de rotina no Hotel das Cataratas em Foz do Iguaçu, e toda a diretoria e vários membros do Board depois vieram para Rio de Janeiro.  Foi a oportunidade que queríamos para apresentar nosso plano para finalmente terminar as reformas do prédio principal do hotel.  Era uma obra complicada, pois envolvia a ampliação de 60 banheiros e a reforma completa de 90 apartamentos, além do aumentar o espaço da Recepção do hotel em mais de 60%, e só poderia ser realizado com o fechamento completo do prédio principal do hotel por um período de quatro meses.  Alguns membros do Board estavam hesitantes, principalmente em função do impacto que o fechamento do prédio principal teria nos resultados do hotel, e alguns membros da diretoria achavam que o Copa já estava levando uma fatia desproporcional dos recursos da companhia destinados a novos investimentos, em detrimento aos demais hotéis, alguns dos quais estavam há anos na fila. Tínhamos, entretanto,  uma “carta na manga” que acabou sendo o argumento decisivo a nossa favor, que foi a compra do Hotel Glória pelo empresário Eike Batista,  dono do oitava maior fortuna do mundo, segundo a lista da revista Forbes, e o anuncio feito pelo mesmo que pretendia transformar o Hotel Glória num hotel de seis estrelas para figurar entre os cinco melhores hotéis do mundo.  Diante de tamanha ameaça a hegemonia do Copa, não havia como não aprovar o investimento solicitado.