A crise financeira mundial de 2008, que teve como fato mais dramático
o pedido de concordata do conhecido banco de investimentos americano Lehman
Brothers teve imediatas consequências
para o grupo Orient-Express.
Embora no ano como um todo o grupo ainda apresentou um lucro operacional
de US$125M, o ultimo trimestre do ano tinha sido uma perda total, e as vendas
no primeiro trimestre de 2009 demonstraram uma queda de 22% sobre o mesmo trimestre de 2008. As ações do grupo na bolsa de Nova York
despencaram para níveis jamais vistos provocando uma enorme erosão de riqueza
para os acionistas. Mais grave ainda era
o fato que a dívida de Orient-Express com os bancos andava por volta de US$800
milhões, pois era através de empréstimos bancários que o grupo financiava seu
crescimento. Até então esta dívida era
considerada compatível com o tamanho da companhia, levando em conta seus ativos
e expectativas de lucros operacionais, mas agora, com os bancos sofrendo um
crise de liquidez, os bancos passaram a
exigir uma redução nas linhas de crédito.
Mas com os lucros em queda livre e as operações hoteleiras não
produzindo o cash-flow necessário, de onde viria o dinheiro? Diante da situação crítica, o Board do
Orient-Express tomou a única opção disponível que era de vender alguns dos seus
hotéis, principalmente três ou quatro dos hotéis menores, mas também incluindo
hotéis mais conhecidos como o Lapa Palace em Lisboa, e o Windsor Court em New
Orleans. Felizmente, foi possível
encontrar compradores para todos eles, mesmo num mercado recessivo. De todos os hotéis vendidos, o que provocou
mais tristeza foi a venda do Windsor Court em New Orleans. Com seus 300 suites, o Windsor Court era um
dos maiores e mais luxuosos hotéis do grupo e durante boa parte da década de
’90 tinha sido o hotel mais lucrativo da companhia. Em vários ocasiões o hotel havia sido
escolhido como o melhor hotel dos Estados Unidos, na pesquisa anual realizada
junto aos seus leitores pela prestigiosa revista Conde Nast Traveller e era de
longe o maior símbolo da marca Orient-Express no mercado americano. Infelizmente, entretanto, a cidade de New
Orleans tinha sido duramente castigada pela catastrófica inundação sofrida após
a passagem do furacão Katrina em 2005, que obrigou a cidade a ser evacuada
pelos seus moradores e provocou prejuízos estimados em mais de US$100
bilhões. O prejuízo para o hotel foi
tanto que mesmo quatro anos depois, o Windsor Court ainda era uma mera sombra
do hotel que um dia tinha sido. Como não podia deixar de acontecer, aqui no
Brasil havia muita especulação quanto a possível venda do Copacabana Palace, e
mal passava uma semana que não havia alguma nota publicada na imprensa neste
sentido, sempre desmentida pelo Orient-Express. Como Paul White, o CEO da
companhia me assegurava “Prefiro vender a companhia inteira do que vender o
Copacabana Palace”. É que o Copacabana
Palace, junto com o Cipriani de Veneza, e o Grand Hotel Europa de São
Petersburgo eram os hotéis mais lucrativos da companhia, e além disso são
considerados ícones mundiais e com isso agregavam valor aos demais hotéis do
grupo. Felizmente, nunca foi preciso
vender nenhum dos “flagships”do Orient-Express, pois além de vender alguns
hotéis, o grupo ainda levantou mais de US$400 milhões lançando mais ações no
mercado acionário com preços variando entre US$5 e US$10, diluindo os demais acionistas no
processo. No final, a companhia estava
salva, e continuava independente, mas o custo tinha sido pesado.
Enquanto a matriz de Orient-Express e boa parte da companhia estavam
mergulhadas numa crise sem precedentes, o Copacabana Palace continuava de vento
em popa como se nada estivesse acontecendo.
O lucro operacional em 2008 bateu um novo recorde, chegando a US$15,3M,
um aumento de 15% em relação ao ano anterior, e mesmo em 2009, quando o hotel
apresentou um ligeiro recuo no lucro operacional para US$14,5M, o “performance”
do hotel foi de longe o melhor entre todos os hotéis da companhia. A razão principal para estes resultados
excepcionais era o aumento expressivo no número de hóspedes brasileiros, que
mais que compensavam a redução de hóspedes europeias e americanos, aliado ao
excelente movimento do departamento de alimentos e bebidas. Em hotelaria, é rara que a receita de
alimentos e bebidas atinge 50% da receita de hospedagem, mas no Copacabana
Palace, em 2009, a receita de alimentos e bebidas representou 86,5% da receita
de hospedagem. Se as coisas já andavam
bem para o Copacabana Palace, logo iriam melhorar mais ainda, com o anuncio, em
outubro de 2009, que a cidade de Rio de Janeiro havia vencida a disputa para
sediar os Jogos Olímpicos de 2016. O
efeito positivo deste anuncio para a hotelaria da cidade foi instantâneo, com
um imediato aumento na demanda de hospedagem, principalmente vindo do mercado
interno. Com tantas notícias positivas,
não é de estranhar que o Board do Orient-Express continuava a aprovar nossos
planos de investimento. Em janeiro de 2009
já havíamos inaugurados o “Bar do Copa” e durante o primeiro semestre de 2009
reformamos e modernizamos totalmente os apartamentos de fundo do Anexo,
ampliando o hotel em mais 20 apartamentos no processo. Em junho de 2009, o Board de Orient-Express
realizou uma reunião de rotina no Hotel das Cataratas em Foz do Iguaçu, e toda
a diretoria e vários membros do Board depois vieram para Rio de Janeiro. Foi a oportunidade que queríamos para
apresentar nosso plano para finalmente terminar as reformas do prédio principal
do hotel. Era uma obra complicada, pois
envolvia a ampliação de 60 banheiros e a reforma completa de 90 apartamentos,
além do aumentar o espaço da Recepção do hotel em mais de 60%, e só poderia ser
realizado com o fechamento completo do prédio principal do hotel por um período
de quatro meses. Alguns membros do Board
estavam hesitantes, principalmente em função do impacto que o fechamento do
prédio principal teria nos resultados do hotel, e alguns membros da diretoria
achavam que o Copa já estava levando uma fatia desproporcional dos recursos da
companhia destinados a novos investimentos, em detrimento aos demais hotéis, alguns
dos quais estavam há anos na fila. Tínhamos, entretanto, uma “carta na manga” que acabou sendo o
argumento decisivo a nossa favor, que foi a compra do Hotel Glória pelo
empresário Eike Batista, dono do oitava
maior fortuna do mundo, segundo a lista da revista Forbes, e o anuncio feito
pelo mesmo que pretendia transformar o Hotel Glória num hotel de seis estrelas
para figurar entre os cinco melhores hotéis do mundo. Diante de tamanha ameaça a hegemonia do Copa,
não havia como não aprovar o investimento solicitado.
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