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domingo, 28 de agosto de 2011

O Grande Pulo


No final de Outubro de 1983 eu fui surpreendido com um telefonema do Superintendente do grupo Veplan, empresa proprietaria do Rio Palace, me convidando para uma conversa no Rio de Janeiro com vistas de vir a assumir a gerência geral do Rio Palace.  Expliquei que não estava buscando uma mudança de onde me encontrava e que eu estava gostando do meu trabalho no Quatro Rodas, mas, coincidentemente, na semana seguinte eu estaria viajando para Rio para participar do BTM - Brazilian Travel Mart – um evento comercial do trade turístico brasileiro, e já estava inclusive com reserva feita no próprio Rio Palace.  Agendamos então um encontro, e isso levou em seguida a marcação de um encontro com o dono do grupo, José Carlos Ourivio, na residência dele no Leblon.  O encontro com José Carlos transcorreu de uma forma muito cordial, e conversamos sobre vários assuntos.  Disse-lhe, inclusive, que eu não me achava a pessoa  ideal para trabalhar no Rio Palace, pois, segundo se comentava no mercado, a gestão do Rio Palace era caracterizada pelo envolvimento, tanto do próprio Ourivio, como dos demais diretores do grupo Veplan, e que eu não atuava bem nesse tipo de ambiente,  já que a delimitação do meu espaço profissional e da minha própria autoridade era um valor fundamental para mim.  Disse-lhe que e o grupo Quatro Rodas,  havia contratada recentemente uns consultores da área de Recursos Humanos com o objetivo de traçar o perfil psicológico de todos seus executivos, e esta observação constava do meu laudo.  Ourivio se interessou pelo  laudo acabei passando-lhe uma copia. O laudo era, no geral, bastante positivo, mas também continha algumas criticas e sugestões de como eu poderia me aprimorar.  Quando passei-lhe a copia eu disse  “Olha, eu não concordo com tudo que esta escrito neste laudo, mas, reconheço que um trabalho bastante bem feito,  e acredito que retrata corretamente o tipo de gestor que penso que sou”.  “Pelo menos, as partes boas estão corretas”, acrescentei, rindo.  Ourivio havia ficado  intrigado com meu comentário sobre seu envolvimento na gestão do hotel, e me disse que não era isto sua intenção.  Ele me disse que o escritório dele ficava  no centro da cidade e só raramente ele comparecia no hotel.  Alem disso, ele tinha muitos outros afazeres com os demais empresas do grupo, e o que ele procurava mesmo era um profissional que assumiria total responsabilidade pela gestão do hotel.   Ainda conversamos sobre outros assuntos, inclusive sobre Flamengo, time pelo qual ambos torcemos, e o encontro terminou da mesma forma que começou, de uma forma bastante cordial. Quando saímos da casa do Ourivio, o Superintendente da Veplan, que havia participado do encontro estava bem feliz.  “Tenho certeza que o emprego e seu, caso você queira”, ele me falou “conheco bem o José Carlos, e ele gostou muito de você!”   E de fato ele teve razão, pois poucos dias depois recebi  do Ourivio uma oferta formal para assumir a gerência-geral do Rio Palace, o icónico hotel do posto seis em Copacabana.  Embora eu estava feliz no Quatro Rodas, e gostava de morar em Olinda, era uma oferta irrecusável,  tanto pelo pacote de remuneração e benefícios oferecidos, e mais ainda pela oportunidade de assumir a gerência-geral de um dos mais importantes hotéis do Rio de Janeiro, e do pais.  Pedi então demissão do Quatro Rodas, e em Dezembro de 1983,  com 37 anos de idade, assumi a direcao de um dos mais renomados hotéis brasileiros.  Era um passo decisivo no caminho que me levaria, seis anos depois, a assumir a direcao do Copacabana Palace.

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

O Vôo Charter


Logo depois de voltar ao Brasil depois de participar do Congresso da ASTA, me vi envolvido numa longa e difícil negociação para conseguir trazer a hospedagem da tripulação da British Caledonian para o hotel.  Ate então a tripulação se hospedava num hotel na praia de Boa Viagem,  bem próximo ao aeroporto dos Guararapes.  O Hotel Quatro Rodas ficava em Olinda, bem mais distante, e era necessário um grande trabalho de convencimento para demonstrar que a distancia maior em relação ao aeroporto seria compensado com uma estadia mais agradável.  Alem de convencer a própria companhia, era preciso também convencer os dois sindicatos (dos pilotos e do pessoal de cabine) que a mudança seria benéfico.  A negociação levou meses, mas finalmente acabou sendo bem sucedida.   A tripulação ocupava 30 apartamentos diariamente, e isto sozinho representou um aumento de 15% na ocupação do hotel.  Alem disso, a tripulação da British Caledonian era composta predominantemente de gente jovem e divertida, e sua presença no hotel era motivo de muito alegria.  Logo depois disso, conseguimos fechar a hospedagem do “cabin crew” da Air France, que ocupavam mais 15 apartamentos durante cinco dias da semana, e a partir disso o hotel tinha uma base solida para melhorar seu performance económico, como acabou acontecendo.

Embora o fechamento desses dois negócios fossem importantes para o hotel , em nada se comparariam com o que aconteceu em seguida.   Em Abril de 1983, fui procurado por um operador da Suica que se dizia interessado, junto com um sócio alemão,  em promover um voo charter da Alemanha diretamente para Recife já no próximo verão,  e queria saber se nos pudéssemos ajudar a viabilizar o projeto.  Não entendíamos nada sobre voos charters na época, mas oferecemos  a ajudar no que fosse possível.  Conversei com vários “experts” sobre o assunto, mas todos foram taxativos em dizer que não existia a menor chance do DAC autorizar voos charters da Europa para Recife.  Diziam que isto não interessava a Varig, que desfrutava de grande prestigio dentro do governo, e portanto não iria acontecer.  Apesar das opiniões desanimadores, resolvemos que não custava tentar.  Conseguimos o apoio do então Presidente da Empetur, Helder Lins Teixeira, e através dele, o apoio fundamental do então Governador de Pernambuco, Roberto Magalhães.   Depois de muitas discussões, e muitos percalços, e para grande surpreso de muitos, os voos foram aprovados, e o voo inaugural marcado para dezembro daquele ano.  Com isso, caímos em campo para “vender” os voos e em  Setembro embarquei numa  viagem comercial de três semanas para Alemanha e Suica, visitando todos os principais operadores e agências, com o intuito de trazer mais turistas para o Hotel Quatro Rodas.   Apesar de tudo  senti que ainda havia no mercado alemão uma insegurança se os voos iriam acontecer, ou não, e descobrimos que o próprio escritório da Embratur em Frankfurt, e muito ligado na época a Varig, ainda apostava que os voos seriam cancelados, e divulgavam estas opiniões no mercado alemão.  Felizmente, esses problemas acabaram sendo superados, e foi com um grande emoção que me encontrava em Recife, numa tarde ensolarado de dezembro de 1983,  para assistir o Lockheed Tristar-1011 da LTU, com 276 passageiros a bordo, pousar no aeroporto dos Guararapes em Recife  – o primeiro voo charter da Europa para o nordeste brasileiro.  Eu tinha ido a Recife especialmente para a ocasião, pois já não me encontrava mais no grupo Quatro Rodas.  No dia primeiro de dezembro, eu havia assumido a gerência-geral do Rio Palace, o conceituadissimo e majestosos hotel do posto seis, em Copacabana, no Rio de Janeiro.  Como havia acontecido mais um  “pulo do gato”, na minha carreira hoteleira, eu conto a seguir.

sábado, 13 de agosto de 2011

O Quatro Rodas de Olinda


Chegando no Quatro Rodas de Olinda, encontrei um ambiente completamente diferente daquele do grupo Othon.  Embora o Quatro Rodas não tivesse a estrutura e tradição do Othon, e nem o tamanho, era um grupo muito dinâmico, inovador, e criativo, e com alguns conceitos de administração bastante avançadas para a época.  O grupo pertencia ao Richard Civita, e era fruto da divisão feito no grupo Abril pelo fundador Victor Civita, dividindo o grupo entre seus dois filhos, com a parte editorial ficando com Roberto, e os demais atividades, incluindo hotéis, com Richard.  Embora centralizador por natureza, o Richard havia montado uma boa equipe profissional para dirigir os hotéis.  O diretor-geral era um conhecido hoteleiro francês, Bernard Lefevbre, que havia trabalhado em bons hotéis na Europa, e ainda participado da abertura do Rio Sheraton e do Rio Palace como gerente residente em ambos estes hotéis, antes de assumir o seu posto no Quatro Rodas.  Diferente do Othon, o escritório central era muito pequeno, e isso significava que a autonomia de cada hotel do grupo era muito grande, e o Diretor Gerente de cada um dos hotéis tinha uma responsabilidade muito grande  pelo resultado obtido pela unidade.  No grupo Othon, a politica comercial para cada hotel era determinada pela Diretoria Comercial no Escritório Central, e boa parte do trabalho de vendas e marketing, assim como a responsabilidade pelos resultados obtidos, era concentrado no Escritório Central.  Já no grupo  Quatro Rodas, toda a responsabilidade de definir e depois executar o plano de marketing  cabia a cada hotel, e foi justamente nesta área que eu tinha que me concentrar mais.  Quando cheguei, fazia pouco mais que um ano que o hotel havia sido inaugurado, e a taxa de ocupação ainda estava muito baixa, e  era necessário  fazer um grande esforço para mudar esta panorama.  Ate então, eu tinha tido relativamente pouca experiência na área comercial, mas tudo isso iria mudar nos próximos meses.



Menos de dois meses após ter assumido o cargo, eu já estava viajando para o exterior para participar da minha primeira  viagem de vendas   Justamente participando do Congresso da ASTA (American Society of Travel Agents) – que naquele ano de realizava em Miami, na Florida.  Na época, o congresso da ASTA ainda desfrutava de grande prestigio, e era considerado fundamental participar  na feira de turismo que ocorria junto com o Congresso, caso  quisesse conquistar a cobiçada mercado americano.    A participação neste evento foi um enorme aprendizado para mim, em todos os sentidos, pois foi a partir deste evento  comecei a estabelecer os contactos com agências e operadores importantes, tanto os do Brasil, como do exterior, e aprender como a comercializacao do produto turístico brasileiro funcionava.  O aprendizado não se limitou apenas aos aspectos profissionais da viagem.  Era também a minha primeira viagem para os Estados Unidos, e enfrentei um serie de desafios, típicos de um “marinheiro de primeira viagem”.  O primeiro problema foi chegar ao hotel as 7 horas da manha, e ser informado que o meu apartamento somente seria liberado as 14 horas, sete horas depois!  Depois descobrir que o hotel em que eu estava hospedado, em Key Biscayne, estava distante tanto do local do Congresso como do local da Feira de Turismo, que se realizava em outro local da cidade, e que seria necessário alugar um carro para fazer os deslocamentos.  Foi ai que enfrentei outro problema, que era de não possuir um cartão de credito que  fosse aceito no exterior. Depois de alguma discussão com a locadora, acabei tendo que deixar praticamente todos os meus “travellers cheques” como garantia, mas acabei conseguindo o carro. Foi a primeira vez que eu havia dirigido um carro com cambio automático, e justamente na primeira experiência quase  provoquei um acidente grave no Freeway ao pisar no freio com o pé esquerdo, pensando que era a embreagem!  Finalmente, cheguei no local da feira, procurei o stand do Brasil, e comecei a a organizar nas prateleiras o material promocional que eu havia trazido do Brasil.  Não demorou muito, fui interpelado por uma funcionaria da Embratur,  que me informou que o grupo Quatro Rodas não fazia parte da cooperativa Embratur/Empresas Privadas, que custeava a participação do Brasil na Feira, e portanto eu não poderia expor meu material promocional no Stand.  Eu desconhecia completamente a existência  dessa cooperativa.  Prontifiquei-me a pagar a cota do Quatro Rodas ao voltar para Brasil, mas não houve acordo.  O prazo para o pagamento havia vencido  a funcionaria estava irredutível.  Felizmente, fui salvo por um amigo hoteleiro, o Gerente Geral do Hotel Tropical de Manaus.  Ele me apresentou aos seus colegas da Varig, que havia custeado boa parte do custo do Stand do Brasil, alem de ter fornecido passagens aéreos a preços super-promocionais para toda a delegação brasileira, e eles acabaram me cedendo uma pequena prateleira para eu expor meu material.  Não seria a ultima vez que eu   teria motivos de ficar grato pelo apoio da Varig no esforço de vender o turismo brasileiro no exterior!

segunda-feira, 8 de agosto de 2011

Deixando Othon

Após a passagem por Fortaleza, fui logo designado  para tirar as ferias do gerente-geral do Bahia Othon, o que me obrigava  novamente ficar longe de casa.  Somando o tempo passado em Maceio, com o tempo passado em Fortaleza, e agora mais um mês em Salvador, significava que nos últimos cinco meses eu havia passado três meses e meio longe de casa.   O pior era que, com a nova estrutura administrativa existente no  Escritório Central, a função que eu ocupava de Superintendente de Operacoes – Área Sul  não fazia mais sentido, dai eu ser usado como um espécie de “coringa” para cobrir algum buraco quando surgia a necessidade.  Manifestei mais uma vez a minha insatisfacao com a situação para a Diretoria da companhia, mas nada indicava que iria surgir alguma mudança.  Fui para Salvador, feliz, por um lado, em poder voltar para Bahia, mas infeliz com os rumos da minha carreira e determinado a buscar novos desafios para o futuro.  Queria, de preferência, voltar a dirigir  um grande hotel de cinco estrelas, pois eu já sabia que nada e tão gratificante para um hoteleiro do que ficar a frente de um grande hotel, e a experiência de ter ficado um ano no Escritório Central de  Hotéis Othon  apenas confirmava este pensamento.  Felizmente, não demorou muito para surgir uma boa oportunidade, e no final de Julho aceitei um convite   para ingressar no Grupo Quatro Rodas, para ser Diretor Gerente do Hotel Quatro Rodas em Olinda, Pernambuco – um hotel de 200 apartamentos e classificado pela Embratur com cinco estrelas.  Apresentei meu pedido de demissão do Othon enquanto ainda me encontrava em Salvador, e no final de Agosto de 1982 deixei o grupo Othon para ingressar no grupo Quatro Rodas.  Na minha despedida, um dos diretores do Othon me disse, “Nao posso acreditar que você esta deixando o Othon para entrar no grupo Quatro Rodas, se você fosse para o Rio Palace, eu ate entenderia, mas para o grupo Quatro Rodas????”,  “Pois e”, eu respondi  “mas como e o Quatro Rodas que me ofereceu um emprego, e não o Rio Palace, eu não tenho escolha, mas pelo menos no Quatro Rodas eu sei muito bem o que eu terei de fazer,o que não e o caso aqui no Othon”    Nem um de nos sonhava naquele momento que apenas um ano e quatro meses após esta conversa, eu estaria deixando o Quatro Rodas para assumir justamente o Rio Palace.  Mas isto e conversa para depois.

sexta-feira, 5 de agosto de 2011

Transformações e Tristezas

Em Julho de 1981, após ter passado um ano e nove meses em Belo Horizonte, houve algumas mudanças na Diretoria do grupo no Rio de Janeiro, e acabei sendo convidado para assumir o cargo de Superintendente de Operacoes – Área Sul,  do grupo.  Era um cargo novo na companhia, e eu seria responsável por todos os hotéis do Rio, (com excecao do Rio Othon), e mais os Othon Palace de São Paulo e Belo Horizonte - ao todo eram dez hotéis.  Ficaria lotado no Escritório Central no Rio e me reportaria diretamente para o Diretor de Operacoes, que por sua vez planejava se aposentar dentro de dois anos. Parecia ser uma excelente oportunidade, e com boas perspectivas futuras, e foi com entusiasmo que aceitei o convite e voltei a morar no Rio de Janeiro, depois de uma ausência de quatro anos.  Neste tempo eu havia gerenciado três dos mais importantes hotéis da companhia, em três Estados diferentes,  São Paulo, Bahia, e Minas Gerais, e a experiência adquirida havia consolidada minha reputação dentro do grupo.  Ainda jovem, com 35 anos de idade,  o futuro parecia promissor, e a ultima coisa que passava na minha cabeça era a ideia de sair do grupo Othon.   Mas mal
sabia eu que a mudança para Rio seria o primeiro passo num caminho que, em pouco mais de um ano, me levaria a deixar, definitivamente, a companhia que havia me formado como hoteleiro e como executivo.  Os problemas começaram menos de dois meses depois que assumi o posto, e eu me vi , pelo menos parcialmente, envolvido numa situação que acabou resultando no afastamento do próprio diretor-geral do grupo.  Era uma sexta-feira a tarde quando fui informado que o grupo iria adquirir um hotel em Curitiba, e eu deveria me deslocar imediatamente para aquela cidade.  A compra iria ser fechada na próxima terça-feira e eu deveria chefiar uma pequena equipe que iria assumir o hotel a partir daquela data.  Recebi um dossier sobre o hotel, com todos os dados relevantes sobre a compra, que incluía a informação que o hotel vinha operando com uma taxa de ocupação por volta de 60%, e no sábado de manha embarquei para Curitiba junto com três assessores.  Fomos recebidos no hotel em Curitiba como se já fossemos os novos proprietarios, e começamos logo a trabalhar para preparar o hotel para o “handover”.  No curso desse trabalho, foi possível constatar a informação que a taxa de ocupação do hotel durante os últimos seis meses havia sido de apenas 35%, e não os 60% constante no dossier.  Era uma informação bastante relevante, e na segunda-feira logo de manha tentei, sem sucesso, falar com o Diretor-geral para comunicar esta informação.  Não conseguindo falar com o Diretor-geral, falei com o Diretor Comercial.  “Voce esta me dizendo que as informacoes constantes do dossier estão falsos?”, ele me perguntou.  “O que eu estou dizendo”, respondi, “e que, baseado nos levantamentos que fizemos neste final de semana, e contra-checados de varias formas, eu, e a minha equipe, estamos convencidos que a taxa de ocupação real do hotel, nestes últimos seis meses, não passa de 35%”  “Vou passar esta informação para o diretor-geral”, foi a sua resposta, e desligou o telefone.  Fiquei esperando um novo telefonema do Rio, mas nada aconteceu.  No final da tarde liguei de novo para o Diretor Comercial, e ele me disse “Falei com o diretor-geral, mas ele disse que vocês só estão vendo os números “oficiais”, mas que existe uma “caixa dois” que vocês não estão vendo”.  “Nao estamos baseando nossas conclusões em dados apenas da contabilidade do hotel.  Fizemos uma auditoria operacional, conversamos com funcionários antigos, vimos relatórios gerenciais formais e informais.  Estamos convencidos que a taxa de ocupação real do hotel não passa de 35%”, insisti.  No dia seguinte, o diretor-geral , acompanhado pelo Presidente do Conselho do Othon, chegaram em Curitiba, viajando em jato particular, para concluir a negociação.  Chegando no hotel se fecharam logo numa reunião reservado com os proprietarios do hotel.  Ficamos aguardando o desfecho, na maior ansiedade, mas, depois de umas  três  horas  de reunião surgiu a informação que a negociação não estava indo bem.  Finalmente, no fim da tarde, fomos informados que o negocio não seria fechado naquele dia.  Os diretores do Othon iriam retornar ao Rio, e eu e minha equipe devemos permanecer em Curitiba, aguardando os acontecimentos.  Dois dias depois recebemos a ordem para retornar ao Rio, pois a compra não seria mais realizada.  Cheguei de volta no Rio na sexta-feira a tarde, indo direto do aeroporto para casa, mas ao chegar segunda-feira no escritório recebi a noticia bomba, o diretor-geral tinha sido desligado da companhia!  O principal motivo do seu desligamento não estava relacionado diretamente ao que sucedeu em Curitiba, embora isto fosse um agravante, mas a sua saída, e nas circumstancias em que ocorreu,   acabou provocando um verdadeiro vendaval  na estrutura organizacional do grupo, com desdobramentos em todas as áreas. sendo que a maior consequencia dessas mudanças foi uma perda de autonomia para todos os executivos do grupo, já que todas as decisões importantes passaram a ser  tomadas apenas pelo Conselho de Administração, composta unicamente por membros da família Bezerra de Mello, proprietarios do grupo.    Em consequencia dessas mudanças todas, o meu próprio cargo foi ficando cada vez mais esvaziado, e sem poderes.  O próprio Diretor de Operacoes sentia também este esvaziamento de poder, mas não se achava em condicoes de mudar a panorama.  Fui conversar com Álvaro Bezerra de Mello para manifestar minha insatisfacao com a situação, mas ele me explicou que ele também vinha enfrentando  muitas dificuldades com seus irmãos no Conselho, e por ser dono  de apenas uma décimo-primeira parte da companhia, não tinha condicoes para mudar a situação.



De qualquer forma, no final de Fevereiro de  1982 o grupo decidiu adquirir o Hotel Pajucara em Maceio, e fui novamente designado para  chefiar a equipe do “takeover”.  Era um hotel de três estrelas, e estava longe do padrão Othon de qualidade, mas nesta época a politica do grupo era de crescer a qualquer custo, e Maceio já despontava como uma atracão para o mercado turístico nacional.  Passei ao todo seis semanas em Maceio, tempo necessário para implantar os sistemas do “Othon” e aguardar a chegada do novo  gerente-geral do hotel.



 Em Abril voltei novamente para o Rio, mas logo no mês seguinte surgiu uma emergência medica com o filho do Diretor  do Imperial Othon Palace em Fortaleza, e este  foi obrigado a se licenciar para tratar do problema.  Na falta de outro substituto  disponível, fui enviado para Fortaleza para substitui-lo, permanecendo na cidade por pouco mais de um mês.  O Imperial Othon era um hotel de grande porte, mas embora fosse classificado como um hotel de cinco estrelas,  faltava o luxo e requinte que se encontrava no Bahia Othon, ou no Belo Horizonte  Othon.  Eu estava no hotel há menos de uma semana quando fui acordado, ainda de madrugada, com a informação que um avião da VASP havia colidido com um morro na aproximação para o aeroporto de Fortaleza, e que todos os passageiros e tripulantes haviam falecidos.  O Imperial Othon era o hotel que hospedava todas as tripulacoes da VASP, e tinha uma aproximação muito grande com aquela companhia aérea.  A partir daquele momento, o hotel se tornou o centro de operacoes para o atendimento aos familiares das vitimas da tragédia, e o centro de convencoes do hotel foi convertido no central de atendimento.  Durante os próximos dias o hotel foi inteiramente tomada pelo drama e tristeza do atendimento aos familiares das vitimas, e as cenas de desespero e inconformismo com a tragédia eram constantes.  Um dos problemas foi a impossibilidade de reconhecer os corpos, o que impedia que os familiares pudessem levar os corpos para serem enterrados nas suas cidades natal, conforme era o desejo da maioria.  Os ânimos dos familiares estavam exaltados e a frustracao com a burocracia do Estado, aliado a uma crescente hostilidade direcionada aos diretores da VASP, ameaçavam tornar o ambiente insustentavel.  Foi neste momento critico que o Cardeal Arcebispo de Fortaleza, Dom Ivo Lorscheider, veio ao hotel, e em poucos minutos conseguiu, com palavras de grande sabedoria,  acalmar os ânimos, e transmitir  conforto e serenidade para os familiares.  Foi um trabalho notável do Cardeal, que conseguiu inclusive a concordancia dos familiares em realizar um enterro coletivo, com uma cerimonia ecumenica, como acabou ocorrendo no dia seguinte.   No meio dessa grande tragédia, o pessoal do hotel  se desdobrava para tentar amenizar o sofrimento de todos.  Foi, para mim, uma experiência dramática, marcada pela grande tristeza  e sofrimento dos familiares das vitimas do desastre, e ate hoje, passados quase trinta anos,  minhas recordacoes dos traumáticos eventos daquela semana só me tragam lembranças tristes.

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Belo Horizonte

Comparado com  Bahia, o trabalho no Othon de Belo Horizonte foi bem mais tranquilo,  pois, embora os dois hotéis eram de tamanho similar (o Othon de BH tinha 317 apartamentos, contra 301 da Bahia), o hotel de Belo Horizonte era infinitivamente mais fácil para administrar.  As razoes disso eram várias, começando  pelo fato que em Belo Horizonte já encontrei uma equipe gerencial super bem montada, e muito profissional.  Diferente do que ocorrera na Bahia, o trabalho de abertura do hotel, realizado exatamente um ano antes de eu chegar,  havia sido muito bem planejada e executada, e o hotel já havia consolidado sua posição como o melhor hotel da cidade.    Alem disso, o hotel  era frequentado principalmente por executivos  em viagens de negócios a Belo Horizonte, que e uma clientela bem mais fácil de lidar de que tratar com o turista de lazer, que era a clientela predominante na Bahia.  Somando-se a isso, a mão de obra local era disciplinado e responsável, e isso facilitava muito o trabalho dos gerentes.  O hotel desfrutava de uma boa taxa de ocupação durante os dias de semana, mas a ocupação caia muito nos finais de semana, o que permitia que metade dos funcionários folgasse aos Sábados, e a outra metade aos Domingos.  Os fins de semana, portanto, sempre eram muito tranquilos, e isso também representava um grande contraste com Bahia que tinha os fins de semana muito movimentados.   

Apesar de ter trocada a praia de Ondina em Salvador pela Avenida Afonso Pena, no centro de Belo Horizonte, a qualidade de vida que desfrutávamos na cidade era muito boa.  Nos finais de semana frequentávamos os otimos clubes existentes na cidade, onde passei novamente a praticar o ténis, com os amigos, enquanto as crianças brincavam nas piscinas.  Fizemos boas amizades na cidade, e assim éramos convidados  para muitos eventos sociais,  o que tornava a vida ainda mais agradável, e a vida seguia com muita tranquilidade.  Aproveitamos  também os fins de semana para conhecer  as cidades históricas de Minas, como Ouro Preto e Mariana, que ficam próximas a Belo Horizonte, e as vezes vínhamos para o Rio, já que a distancia não e tão grande, mesmo de automóvel.

 Não obstante o Belo Horizonte Othon ser um hotel super tranquilo, ocorreu um episódio inusitado,  que nos causou um grande  dor de cabeça.  Um hospede, um senhor de Recife, Pernambuco, preencheu  o formulário de “sugestoes de hospedes”  que os hotéis colocam nos apartamentos para avaliar a qualidade dos serviços, queixando-se dos altos preços cobrados pela lavandaria do hotel para lavar algumas camisas.  Como de habito, o hospede colocou seu nome e endereço no formulário, mas em vez do formulário ser depositado no caixa existente para este fim na recepção do hotel, não se sabe como, o formulário foi para na mão de uma outra pessoa,  que resolveu responder a reclamação como se fosse ele próprio o dono do hotel.   Datilografada em papel timbrada do hotel,  a carta era muito bem escrita, mas em vez de pedir desculpas,  ou de justificar o preço cobrado pela lavandaria, era  ofensiva ao extremo.  A carta começou dizendo que o reclamante era obviamente uma pessoa de poucos recursos, visto que viajava com pouca roupa, dai a necessidade de recorrer aos serviços da lavandaria do hotel .  Se fosse “uma pessoa do bem” viajaria com uma quantidade de camisas suficientes para dispensar um serviço de lavandaria.  Ainda por cima, tratava-se obviamente de uma pessoa mesquinha, pois apenas uma pessoa mesquinha reclamaria sobre algo tão insignificante quanto ao preço da lavagem de uma camisa.  A carta concluía  que o reclamante certamente não estava  habituado a frequentar hotéis de cinco estrelas, e  terminou recomendando ao ex-hospede que   “... na sua próxima visita a Belo Horizonte, recomendo-lhe procurar hospedagem num pensão barato, perto do Rodoviário, onde certamente V.S. descera do ónibus  ao chegar de Recife.  Assim você se sentira mais em casa, e quanto ao  meu hotel,  limita-se a passar pela porta”    No final, a carta estava assinada por Roberto Bezerra de Mello, um dos acionistas de Hotéis Othon, e também residente na cidade de Recife, onde era uma pessoa muito conhecida.  Vocês podem imaginar a indignação do recipiente ao ler a carta, e a confusão que isto provocou em Recife.  De qualquer maneira, uma vez esclarecida que se tratava de uma carta forjada, seguia-se uma investigação para descobrir “o autor” da carta.  As suspeitas iniciais recorriam naturalmente sobre os funcionários do hotel, mas depois de muita investigação, nada foi comprovada.  Concluiu, finalmente, que o formulário de reclamação deve ter caído na mão de outra hospede, provavelmente também de Recife, e este foi o autor da carta.  De qualquer forma, uma vez serenado os ânimos, demos umas boa gargalhadas.  A carta, embora sendo um exemplo de como não se deve responder a uma reclamação, não deixava de ter um tom hilariante, que muitos gerentes gostariam de adotar ao responder a determinadas reclamacoes, pois, como sabemos, nem sempre o cliente esta com a razão.