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sábado, 7 de maio de 2011

Antes do Começo

Antes do Comeco........                                                  





Nasci no ano de 1946 na cidade de Accrington, pequena cidade no condado de Lancashire, no norte da Inglaterra.  A regiao de Lancashire era o centro da industria textil na Inglaterra, que havia conhecido seu apogeu no final do seculo 19, para depois entrar num longo periodo de declinio, ate finalmente se extinguir por completo, mas em 1946, a industria ainda sobrevivia.   Foi a epoca pos-guerra, e Inglaterra, quase falida pela segunda guerra mundial, vivia um periodo de grande austeridade.  Os hospitais estavam cheios de soldados ainda se recuperando dos ferimentos da guerra, e consequentemente nasci na casa dos meus avos, com a minha mae sendo assistida no parto apenas por minha avo e a parteira da regiao, como era usual.  Ficaram todos surpresos entretanto ao constatarem que nao era apenas uma crianca que nascia, mas duas, pois eramos gemeos, eu, e minha irma!  Como tudo estava preparado para apenas uma crianca, o meu primeiro berco foi uma gaveta improvisada, o que pelo menos me permite afirmar, categoricamente, que “nao nasci num berco de ouro!” Sempre me condiderei uma pessoa de sorte, e a primeira sorte foi ter nascido dez minutos antes da minha irma, que me concedia durante nossa infancia uma certa ascendencia em relacao a minha irma, pois , nas discussoes, a falta de uma melhor argumentacao era sempre resolvida com um “cala a boca, pois sou mais velho que voce!”  Nao sei como teria sido a minha vida se eu nao fosse assim!



Quando eu tinha quatro anos de idade, meus pais vieram  para Brasil, mais precisamente para Recife, onde meu pai foi contratado para trabalhar no grupo Othon Bezerra de Mello, que tinha interesses na area textil e acucareira.  Meu pai era contador de formacao, e sendo natural de Lancashire, tinha um grande conhecimento da area textil.  Naquele tempo, muitas empresas brasileiras contratavam profissionais na Inglaterra, em funcao de existir uma carencia de mao de obra qualificada no Brasil, e no grupo Othon havia dezenas deles.  O contarto do meu pai com o grupo era de tres anos, apos o qual ele pensava em regressar para Inglaterra.  Eramos para ter vindo ao Brasil de navio, mas duas semanas antes de viajar eu e minha irma contraimos sarampo, e a viagem teve que ser adiada.  Para compensar o atraso, resolveu-se que nao viajariamos mais de navio, e sim de aviao, e foi assim que finalmente embarcamos num constellation do Panair do Brasil para a viagem de Londres a Recife, com escalas em Paris, Lisboa, e Dacar.  Nunca vou esquecer o impacto que me causou a nossa chegada no aeroporto dos Guararapes em Recife.  Era meio-dia, no mes de dezembro, e o calor, e a claridade um total contraste com o frio e escuridao de Accrington!  Ficamos hospedados por alguns dias no “Pensao dos Ingleses” no centro de Recife, e depois mudamos para uma casa proxima a praia no bairro de Boa Viagem, um local considerado distante do Centro, e onde so havia casas, algumas das quais residenciais, mas a maioria de veraneio.  Meu Pai, vestindo ternos de linho branco, como era o costume,  saia para trabalhar cedo, pois o trabalho se desenvolvia em dois turnos, o primeiro das 7 as 11hrs, e o segundo das 14 as 18hrs.  Com isso, meu Pai almocava todo dia em casa, e nos iamos ao ponto do onibus aguardar sua chegada, sempre no mesmo horario pois nao havia engarrafamentos.  Desse tempo tenho muitas recordacoes da praia de Boa Viagem, para onde iamos todos os dias.  Nao havia tubaroes com os quais se preocupar, mas havia muitas aguas-vivas, principalmente as temidas caravelas portuguesas, para as quais tinhamos que estar sempre atentos.  Nos fins de semana, frequentavamos o “British Country Club”, vizinho do Clube Nautico Capibaribe na Avenida Rosa e Silva.  Tratatava-se de um tipico clube ingles da era colonial, onde as senhoras sentavam na varanda tomando cha, enquanto os homens jogava cricket , ou tenis, ou entao sinuca, e a noite todos tomavam seus “gin and tonics” no amplo bar.  Enquanto isso, nos criancas brincavamos soltos nos amplos jardins, longe dos adultos.  Na pereferia do clube estava situada a igreja anglicana, que tambem funcionava como uma escola primaria.  E que naquele tempo, havia aproximadamente 700 familias britanicas morando e trabalhando em Recife, e todos frequentava o clube.

Seis meses depois de termos nos instalado em Boa Viagem, meu Pai chegou em casa um dia com a noticia que iriamos mudar para o interior de Pernambuco, pois ele havia sido promovido ao cargo de Chefe de Escritorio de uma usina de acucar pertencente ao grupo em Rio Una, um pequeno vilarejo proximo a Barreiros,  perto da fronteira com Alagoas e foi la que acabamos passando os proximos dois anos, sendo que, uma vez por mes, passavamos um final de semana em Recife, sempre hospedados no “Pensao dos Ingleses”, e sempre frequentando o “British Country Club”.   A viagem de carro, ou de jipe, entre Recife e Rio Una era sempre uma grande aventura e levava umas quatro horas em estradas de terra batida.  Os carros e caminoes que passavam levantavam nuvens de poeira, e era preciso cobrir o nariz e a boca com lencos para proteger da poeira.  Na epoca de chuva, a estrada ficava simplesmente intransponivel, e passavamos tres ou quatro meses sem conseguir visitar Recife.

A vida em Rio Una era muito pacata comparada com Recife, mas mesmo assim tinha um ritmo proprio toda especial. O vilarejo nao tinha mais que quinhentos moradores, e o local era dominado pelo imponente presenca da  usina de acucar. Fora a usina, havia o escritorio central, onde meu pai trabalhava; um posto medico; uma unica rua de terra batida, com casas pequenas de um lado e casas um pouco maiores do outro lado; uma quitanda; um acougue, e subindo um pequeno morro, a “casa grande”, e a igreja – na verdade uma pequena capela.  Quando chegamos, moramos inicialmente na “casa grande”, cercado de mordomias de todos os lados, mas depois foi construida uma casa nova proxima a “casa grande” onde finalmente fomos morar.  Eu e minha irma logo ganhamos um cavalo de presente, e todas as tardes saimos para passear nas redondezas, pois as manhas eram ocupados com aulas de alfabetizacao, administradas por nossa mae, com o auxilio de um curso por correspondencia vindo da Inglaterra.  Tambem visitavamos frequentemente as lindas praias de Tamandare, e Sao Jose da Coroa Grande,  - praias absolutamente desertas na epoca – e que hoje sao reconhecidas entre as mais belas praias do nordeste.  Havia muita atividade em torno da igreja, que realizava procissoes em todos os dias santos e que a noite se transformava em festas na praca central, mas o evento mais aguardado era a chegada do cinema intinerante, que ha cada dois meses montava um barracao de lona na praca central, e cada morador levava sua propria cadeira para sentar e assistir o espectaculo.

Em pouco tempo de convivencia, eu e minha irma ficamos bem enturmados com a garotada local, e  tinhamos uma vida muito livre e solta, andando por todos os lugares.  Me lembro certo dia que alguem no vilarejo havia morrido e ia ser enterrado em Barreiros, a cidade proxima, pois nao havia cemeterio em Rio Una.  Nao pensamos duas vezes, e subimos no caminhao que transportava tanto o caixao como os familiares e amigos do defunto, e fomos acompanhar o enterro em Barreiros.  Me lembro chegando tarde em casa e nossa mae perguntando “Onde e que voces andavam?”, e respondemos, com toda naturalidade “ah, tivemos acompanhando um enterro em Barreiros”.  Outro truque que aprendi com os garotos locais era de pular nos vagoes dos trens que traziam a cana para ser moida na usina.  Aguardavamos num barranco nas proximidades de uma curva, que obrigava o trem a andar mais devagar, e quando o tren passava pulavamos  em cima da monte de cana de acucar e jogavamos a cana para fora para depois mastigar.   Era uma brincadeira perigosa, pois qualquer escorregao seria fatal, mas nao pensavamos no perigo.

Foi neste periodo que fui assistir meu primeiro jogo oficial de futebol.  O time local de Barreiros estava disputando um campeonato regional, com chances de sagrar-se campeao caso vencesse o ultimo jogo, que seria jogado no campo de Barreiros, um estadio acanhado com instalacoes precarias.  A expectativa na cidade em torno do jogo era enorme e meu pai resolveu me levar para assistir ao jogo.  No inicio tudo trancorria bem, pois o primeiro tempo termonou com Barreiros vencendo o jogo por 1 x 0.  Em meados do segundo tempo, entretanto,o juiz marcou um penalty contra Barreiros, e iniciou-se uma grande pancadaria no campo que logo tomou conta de todo o estadio.  Foram dados muitos tiros para o alto, e foi uma correria louca para escapar da confusao.  Me lembro chegando  em casa e meu pai jurando nunca mais comparecer num jogo de futebol no Brasil.  Jura, alias, que nao cumpriu, pois me lembro anos mais tarde ele me levando para assistir Botafogo x Canto do Rio no General Severiano, e Santos x Benfica, no Maracana, pelo campeonato Mundial de Clubes - mas isso ja e outra historia!

Em meados de 1953, ja havia passado dois anos e meio do contrato do meu Pai  com o Othon, e eu e minha irma ja estavamos com sete anos de idade, e precisando comecar o colegio.  Como Othon havia solicitado ao meu pai para permanecer por mais seis meses no Brasil, meus pais resolverem que seria melhor eu e minha irma voltar logo para Inglaterra para poder comecar as aulas no inicio do ano letivo ingles no mes de agosto, e ficariamos morando na casa dos nossos avos em Accrington, entao mudamos mais uma vez de continente, e trocamos o sol e calor do nordeste brasileiro pelo frio e cinzento Inglaterra, e foi assim que minha nossa mae nos levou de volta para Inglaterra, enquanto meu pai continuava trabalhando no Brasil.  A volta de Recife para Inglaterra foi feita no navio Alcantara, pertencente a Royal Mail Lines, e foi simplesmente espectacular, pois a gente passava o dia inteiro brincando com as muitas outras crianca a bordo.  Um dia, foi permitido aos passageiros visitar a ponte do comando, e o Capitao permitiu que eu ficasse alguns minutos segurando o “wheel”, como se estivesse de verdade “dirigindo” o navio.  Corri para contar a novidade para minha mae, e ela respondeu “bem que eu senti o navio fazendo uns zigue-zaques!”.  Me lembro bem a passagem pela baia de Biscaia, quando pegamos uma tempestade enorme que fazia o navio balancar muito.  Tinha sido proibido utilizar a piscina pois a agua da piscina corria de um lado para o outro com o balancar do navio.  Mesmo assim,jogamos os botes salva-vidas dentro da piscina e ficamos em cima deles sendo jogados de um lado para o outro, ate um tripulante descobrir e mandar todo mundo sair immediatamente.

Chegando na Inglaterra, fomos morar na casa dos meus avos em Accrington.  Minha mae ficou conosco algumas semanas ate comecar as aulas e ai voltou para Brasil.  Passamos entao quase um ano morando com nossos avos, que eram pessoas simples, mas muito boas, ate nossos pais retornar e ai fomos morar com eles numa outra casa, tambem em Accrington.  Nesta altura, eu  ja havia me tornado torcedor do Accrington Stanley, o time de futebol local, que disputava a terceira divisao ingles, e assistia quase todos os jogos quando o time jogava em casa.  Quando eu tinha  onze anos de idade, meu pai mudou de emprego e fomos morar em outra cidade, Ilkley, uma cidade pequena mas muito bonito perto de Leeds, onde meu pai trabalhava.  Logo depois disso passei a frequentar um colegio interno so para meninos, o Hutton Grammar School, onde passei os proximos tres anos.  O colegio interno era uma dureza, com uma rigida disciplina, que mais parecia um quartel do exercito, mas aos poucos fui me adaptando.  Felizmente, sempre fui bom nos esportes, e isso era uma qualidade fundamental para se entrosar bem com os outros e fazer amizades.  Mesmo assim, sentia muitas saudades de casa, principalmente porque nesta epoca minha mae ficou doente e teve que ser internada num hospital, e nao era permitido que eu fosse visitar-la.  Varias vezes pensei em fugir do colegio, mas nao era facil driblar os professores e monitores que ficavam de olho o tempo todo!  Finalmente, acabei me adaptando, e gracas a habilidade de fazer amizades, acabei ate gostando do colegio.  Nas ferias de pascoa de 1960, meus pais vieram com uma grande novidade.  Meu pai tinha aceito um convite para voltar a trabalhar no grupo Othon, desta vez no Rio de Janeiro, e iria assumir o novo posto dentro de seis meses.  “Voce quer continuar estudando em Hutton, e passar as ferias na casa dos seus avos, o quer vir conosco para Rio de Janeiro , onde voce pode estudar no “British School of Teresopolis”, um internato misto?”, perguntou meu pai, me mostrando um folheto do colegio de Teresopolis.  O folheto mais parecia um propaganda para uma colonia de ferias, com mocas e rapazes brincando na piscina, andando de cavalo, e jogando voleibol.  So a ideia de estudar num colegio interno misto ja me agradava, e nao tive duvida em responder “Eu vou para o Brasil!”

E foi assim, que em outubro de 1960, e mais uma vez de navio, fizemos a travessia do oceano Atlantico, ate Rio de Janeiro.  Chegando no Rio, ficamos hospedados no Hotel Aeroporto no centro da cidade, mas logo fomos morar num apartamento alugado no Leme.  Nosso apartamento dava frente para Av. Gustavo Sampaio, mas o predio tinha duas frentes, uma dando para Gustavo Sampaio e a outra para Av. Atlantica.  A ma noticia que recebemos ao chegar no Rio era que o “British School of Teresopolis” nao desfrutava de uma boa reputacao, e, seguindo o conselho do padre da igreja anglicana, meus pais resolverem nao nos matricular la.  Em 1960, o British School de Botafogo, que nada tinha a ver com o colegio de Teresopolis, so tinha alunos ate completarem 14 anos, apos o qual os alunos iam estudar na Inglaterra.  Como nao falavamos portugues, o jeito foi de ir estudar na Escola Americana, localizada ainda na Rua General Urquiza no Leblon, onde acabei estudando do nono ate o decimo-primeiro ano.  De todas as adaptacoes que tive que fazer ao longo da vida, talvez a mais dificil foi a adaptacao de um colegio internato ingles, so para meninos, para a Escola Americana do Rio de Janeiro.  Alem do sistema de ensino ser completamente diferente, toda a cultura da escola era diferente.  Eram dois mundos totalmente distintos!  De qualquer forma, acabei me adaptando, ajudado mais uma vez pela pratica de esportes, pois fiz parte do primeiro time oficial de futebol de salao montado pela escola, e tambem fazia parte da equipe de atletismo.  Em 1962 mudamos de Leme para Leblon, que ainda era um bairro super-tranquilo.  A Avenida Ataulfo de Paiva ainda era de paralelepepios e os bondes andavam nas duas direcoes.  Frequentava muito a praia e jogava futebol com os amigos na Praca Antero de Quental.  Nada mal!  Nesta epoca, influenciado cetamente pelas viagens de navio que havia feito, eu tinha um verdadeiro loucura pela marinha mercante, e queria de qualquer maneira seguir uma carreira naval.  Quando meus pais me convencerem que a era de transporte de passageiros maritimos estava no fim, passei a fixar meus objetivos na Marinha Real inglesa, e por pouco nao voltei a Inglaterra para frequentar e escola naval de la.  De qualquer forma, meus pais queriam que obtivesse o diploma do curso secundario na Inglaterra, e assim, em 1963, com 17 anos de idade, retornei para a mesma escola interna na Inglaterra que eu havia frequentado das 11 aos 14 anos.  Se adaptar de um colegio interno ingles para a Escola Americana do Rio de Janeiro ja havia sido dificil, imagine o que foi fazer o caminho inverso tres anos depois!  Entretanto, apesar de tudo, acabou sendo uma experiencia positiva.  Para comecar, encontrei com varios antigos amigos, e logo percebi que a minha ausencia de tres anos no Brasil havia feito crescer um certo aura de admiracao em torno da minha pessoa.  Eu ja tinha sido popular antes, mas ao retornar, mais velho, todos me tratava com muita deferencia!  Para completar, com a passagem pela Escola Americana, eu havia adquirido um leve sotaque americano, e como em Lancashire isso nao era comun, tambem somava, principalmente com as garotas locais, com as quais a gente se encontrava.  Era a epoca dos Beatles e dos Rolling Stones, que gerou uma epoca de muita rebeldia em relacao as tradicoes e autoridades constituidas, inclusive do colegio.  Apesar de ter sido nomeado “Monitor” ao chegar no colegio, e portanto ter a obrigacao de zelar pela manutencao da disciplina, mergulhei de cabeca nesse clima de rebeldia e logo me tornei um especie de lider de um movimento de contestacao, que questionava o regulamento interno e disciplina vigente.  Junto com mais meia duzia de alunos, aprontavamos barbaridades, e infernizavamos a vida dos professores e diretor do colegio, mas, aos poucos, fomos ganhando concessoes que eram impensaveis poucos anos antes.  Apesar de eu nao ter jogado rugby por tres anos, em poucas semanas de retorno eu ja fazia parte do time principal da escola, e ganhei o direito de marcar a  lapela do blazer do uniforme escolar com os numerais romanos XV, indicando que fazia parte dos quinze jogadores do time principal.  Nada no colegio dava mais prestigioso entre os alunos do que isso.  Passado o inverno, a temporada de rugby terminou e comecou do cricket.  Tambem, em pouco tempo, eu estava no time principal, e ai ganhei  o direito de decorar a outra lapela do blazer com os numerais XI, que denotava que fazia parte do time principal de cricket.  O aluno que ostentava o XV numa lapela, e o XI na outra, so faltava ser carregado no colo – era o prestigio maximo.  Para completar meu prestigio desportivo, eu era o aluno mais veloz da escola, e fazia parte da equipe de atletismo da escola, e no torneio anual da escola conquistei a medalho de ouro nos 100, 200, e 400 metros rasos, sendo que neste ultimo, estabeleci um novo tempo recorde para a prova.  Foi de fato o apogeu da minha carreira esportiva.   Na medida que crescia meu prestigio entre os alunos, decrescia meu prestigio com os professores e o diretor.  Com excecao de um ou outro professor, que realmente motivaram os alunos, a maioria apenas se valiam da autoridade e da disciplina, e esses eu e minha turma combatiam, sem piedade.  Faltando poucos semanas para terminar o ano, acabei sendo  “rebaixado”, perdendo a condicao de monitor, e alertado que eu estava a um passo da expulsao do colegio, o que seria visto como algo muito negativo para o meu futuro, mas consegui sobreviver esta ameaca sem maiores problemas .  Em termos de estudos, foi um ano perdido.  Nao me dediquei aos livros, e as mudancas de sistemas de ensino do ingles para a americana e de volta para o ingles havia deixado lacunas em muitas areas que seriam dificeis de serem superados, mesmo que eu tivesse me esforcado.  No campo desportivo, e ate pessoal, acho ate que valeu, e ao voltar para visitar o colegio quatro anos depois, deparei com uma placa em meu homengem que os alunos mais novos haviam fixados no ponto mais alto do dormitorio – uma grande honra!

Terminado o colegio, fui passear na Irlanda durante um mes, com dois amigos do colegio.  Como tinhamos muito pouco dinheiro,dormiamos normalmente em alburguerges da juventude, mas teve dias que nao haviam vagas nos albergues e entao tinhamos que dormir em cima dos bancos dos jardins.  Para andar de um lugar para o outro,pediamos carona nos caminhoes, ou entao em carros particulares.  Antes de chegar na Irlanda, pouco conheciamos das divisoes internos no pais, mas apos um mes de vivencia haviamos feito um verdadeiro curso intensivo sobre as questoes politicos e religiosos locais.  Embora era uma epoca de relativa tranquilidade na Irlanda, o grau de animosidade existente entre os catolicos e protestantes na Irlanda do Norte era impressionante, e nao era dificil perceber que uma solucao negociada nao seria nada facil de conseguir.

Passado as ferias na Irlanda, ainda passei dois meses dando assistencia a minha avo, que ficou um tempo hospitalizada, mas depois que ela se recuperou, regressei para Brasil, e Rio de Janeiro.  A primeira coisa que fiz ao chegar foi ter aulas de portugues, para melhorar meu conhecimento gramatico e escrito da lingua, para depois procurar emprego.  Pensava inicialmente em buscar uma oportunidade no setor de turismo, onde meu ingles fluente seria util, mas antes que podia concretizar este plano, surgiu uma outra oportunidade, imperdivel, e que acabaria definindo o rumo da minha vida dali para frente.  Um dia, meu pai chegou em casa com a noticia que Hoteis Othon estava selecionando candidatos para um programa de “Trainee”, e que Alvaro Bezerra de Mello, sabendo que eu buscava uma colocacao na area de Turismo, havia perguntado se eu nao queria me candidatar.  Embora a minha primeira vocacao tinha sido trabalhar na marinha mercante, preferencialmente num navio de passageiros, a ideia de hoteis sempre tinham me fascinado.  De uma certa forma, eu via hoteis como se  fossem navios ancorados, tanto e que eu era capaz de citar de cor, e na sequencia certa, todos os hoteis existentes na Avenida Atlantica.  Fui entao fazer os testes e as entrevistas, e depois de alguns dias veiro a noticia que eu havia sido selecionado, junto com mais dois jovens, um frances, e o outro alemao.  Era impressionante, mas, na epoca, os brasileiros da classe media nao se interessavam em seguir uma carreira hoteleira, e a ideia de passar dois anos trabalhando em todoas as funcoes existentes num hotel nao atraia muitos candidatos.  Sorte minha, pois a concorrencia era pouca!  Definido a minha selecao, a primeira providencia foi tirar a carteira profissional.  Fui no Ministerio de Trabalho com toda a documentacao necesaria, e depois de algumas horas na fila de espera, chegou a minha hora de ser atendido.  “Qual e a sua profissao?”, perguntou-me  o funcionario, pois esta era uma informacao obrigatoria que constava na carteira.  “Nao tenho profissao”, respondi, “vou ser um estagiario”.  O funcionario consultou um enorme livro que estava sobre a mesa, e depois de alguns minutos me disse “Estagiario nao e profissao, entao nao serve, o que e que voce vai fazer, exatamente?”  “Vou fazer um pouco de tudo”, respondi.  “Ummm, um pouco de tudo, entao voce vai ser Auxiliar de Servicos Gerais” ele decretou, e assim recebi orgulhosomente minha primeira carteira profissional, e o mais novo “Auxiliar de Servicos Gerais” da cidade estava pronto para encarar o trabalho.




Um comentário:

  1. Jean-Pierre Chabert12 de maio de 2011 às 11:45

    Awesome post. I love reading this blog.

    Thank you very much for a great read.

    Kind regards

    Jean-Pierre.

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