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terça-feira, 17 de maio de 2011

Trocando Cornell University por São Paulo

        Uma das vantagens que eu desfrutava como gerente do Hotel Castro Alves foi a participacao nos diversos cursos de treinamento que o grupo Othon promovia permanentemente, para seus administradores.  Os cursos eram dirigidos principalmente para a area de administracao, como um todo, e tinham bastante proveito pratico para os problemas do dia a dia.  Outro curso de grande valia foi de "Chefia e Lideranca", materia muito importante para qualquer gerente.  Alvaro Bezerra de Mello,  o Diretor Executivo de Hoteis Othon, era o grande entusiasto e incentivador desses cursos.  No final de 1971, ele me chamou e disse, “No proximo ano, eu quero que voce faca o “summer school” em Cornell University.  Voce ficara la por sete semanas.  Vou providenciar a sua inscricao”  Isso era um premio  enorme por mim.  O curso de Cornell  era reconhecido como o maximo em materia de hotelaria, e era considerado um privelegio enorme poder estudar la.  Apos algumas semanas de espera angustiantes, finalmente chegou a confirmacao da minha inscricao no curso, e a partir dai comecei a contar os dias ate eu embarcar. Meu destino, entretanto, acabou sendo outro, pois antes de chegar a hora de partir para Cornell, minha carreira deu outra guinada, que em vez de me levar para o Cornell, acabou me levando para Sao Paulo.  Foi assim que aconteceu; No final de 1970, o Othon havia contratado um gerente novo para o Hotel Trocadero, Daniel Cortez, um cabo-verdiano de nacionalidade portuguesa, que havia feito uma carreira nas cadeias Sheraton e Intercontinental, tendo chegado ao cargo de gerente-geral de  grandes hoteis em ambas estas cadeia, embora ainda bastante joven.  Dizem, entretanto, que se meteu em alguma confusao nas Filipinas, e isto o obrigou a deixar o pais, e foi assim que ele chegou ao Brasil buscando novas oportunidades.  Foi um momento muito oportuno, pois coincidia com a tentativa de Hoteis Othon em modernizar sua administracao para fazer frente a iminente chegada no pais das cadeia internacionais.  O Cortez representava a modernidade, e o futuro.  Falava do “uniform system of accounts” - a biblia da contabilidade hoteleira internacional -com muita eloquencia, e mostrava como se devia organizar um demonstrativo de lucros e perdas, como se devia atribuir centros de custos para todos os departamentos do hotel, e, acima de tudo, demontrava como se podia tornar um hotel mais lucrativo. Era tambem um profundo conhecedor da area de alimentos e bebidas, e um eximio analista de operacoes, Se, “em terra de cego, quem tem olho e Rei”, o Cortez de tornou um verdadeiro Imperador.  Apos poucos meses gerenciando o Hotel Trocadero em Copacabana, foi enviado para Sao Paulo para assumir a gerencia-geral do Othon Palace Hotel, com carta branca para realizar todas as reformas, tanto fisicas como administrativas, para tornar o hotel competitivo com o Hilton.  Modificou completamente o organograma do hotel, implantando um modelo muito similar ao que ate hoje e usado na grande hotelaria, mas que na epoca era uma novidade completa.  Reformou todos os apartamentos do hotel, e todas as areas publicas, incluindo o restaurante e bar, um dos mais movimentados do centro de Sao Paulo, na epoca.  O trabalho foi tao bem sucedido que, depois de 18 meses, Cortez foi promovido ao cargo de Superintendente de Operacoes do grupo, responsavel por todos os hoteis da cadeia.  Contratou um suico, com experiencia na cadeia Intercontinental na Africa, para substituir-lo em Sao Paulo, e mudou-se para Rio de Janeiro para assumir o novo cargo.  Uma das caracteristicas mais marcantes da personalidade de Cortez era a vaidade.  Numa epoca em que carros importados no Brasil era quase uma exclusividade do corpo diplomatico, Cortez circulava pela cidade com seu automovel Mercedes-Benz, placa DC-1938 (Daniel Cortez, seguida pelo seu ano de nascimento).  Enquanto estava em Sao Paulo, havia trazido tres ou quatro assessores do exterior, e esses agora o acompanharam para Rio.  Cortez exigia absoluta lealdade a sua pessoa. Era quase maniaco em relacao a exigencia de haver respeito absoluto a hierarquia interna.  Nao admitia, de forma alguma, qualquer desvio a esse principio.  Trabalhar para Cortez, era quase como mudar de emprego.  Deixava de trabalhar para o Othon, e passava a trabalhar para Cortez.  Era assim que funcionava.  Nos primeiros meses no novo cargo o Cortez praticamente me ignorou, mas, certo dia, inesperadamente, apareceu num final de tarde no Castro Alves, acompanhado de um assessor.  Em vez de se dirigir ate meu escritorio, sentou-se na sala de estar do hotel, e mandou me chamar.  La chegando, mandou-me sentar e foi logo ao assunto, “Eu sei que voce esta inscrito no curso de verao do Cornell University”  “Sim, senhor, e uma grande oportunidade, e estou muito ansioso para o curso comecar”, “Eu tenho uma outra proposta para voce.  Como voce deve saber, ja fiz a completa reorganizacao e reforma do Othon Palace em Sao Paulo, que agora sera um modelo para o resto da companhia.  Contratei um experiente profissional suico para assumir a gerencia geral do hotel, mas falta-lhe experiencia no Brasil.  Estou lhe oferecendo a opportunidade de assumir a sub-gerencia executivo do Othon Palace, reportando-se diretamente ao gerente-geral”  E ai, Cortez fez uma pausa, olhou com desdem as modestas intalacoes do Castro Alves, e disse, “sera uma oportunidade para voce comecar a aprender a verdadeira administracao hoteleira”  “E quanto ao curso em Cornell?”, perguntei.  “Voce tera que cancelar sua participacao no curso”, veio a resposta, e depois de outra pausa, completou “mas eu garanto que com seis meses trabalhando na minha equipe, voce vai aprender muito mais do que se pasasse quatro anos em Cornell.  Bem, eu lhe dou 24 horas para pensar no assunto, e aguardo sua resposta ate amanha".  “Nao preciso de 24 horas” respondi na hora “Ja decidi, aceito a sua proposta”  Cortez me olhou fixamente por alguns segundos, e ja levantando, me disse “Muito bem”, voce se apresenta em Sao Paulo na proxima segunda-feira.  Minha secretaria vai lhe contactar para providenciar as passagens”.  "E quem vai ficar no meu lugar no Castro Alves?", perguntei, "Isso depois eu resolvo" me respondeu Cortez, como se fosse um assunto de menor importancia,  Era maio de 1972, e eu tinha acabado de completar 26 anos de idade.  Eu ainda nao sabia, mas neste momento eu tinha dado um passo decisivo,  que teria desdobramentos e consequencias para o resto da minha carreira!

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