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quarta-feira, 1 de junho de 2011

Chegando em Sao Paulo

        Chegando em São Paulo, era como eu estivesse entrando num outro mundo.  As diferenças entre o Castro Alves e o Othon Palace eram enormes.  Enquanto o  Castro Alves era um modesto hotel de três estrelas, e cuja clientela era predominantemente composta de turistas brasileiras e sul-americanas, o Othon Palace era um imponente cinco estrelas  e, em 1972,  ainda era indiscutivelmente um dos melhores hotéis de São Paulo.  A localização no centro de São Paulo, na Praça Patriarca, era considerada  boa, pois o centro financeiro da cidade ainda ficavam nas proximidades.  A clientela era formada por executivos e homens de negócios, e o hotel ficava quase sempre lotado nos  dias de semana, mas a taxa de ocupação caia para 40-50% nos finais de semana.   Fora isso, haviam dois restaurantes movimentados, e um Bar que faturava mais por dia do que o Bar do Castro Alves em três meses. Alem disso, o hotel tinha mais que 300 funcionários, todos organizados por departamento, e uma estrutura organizacional completamente diferente do que existia no Rio, mesmo quando comparado ao do Leme Palace.    A minha função, de sub-gerente executivo, era similar  hoje  a função de Gerente Residente.   Basicamente, eu era responsável pela coordenação das áreas operacionais do hotel, principalmente das áreas de recepção, governanca, e manutenção.  O gerente de alimentos e bebidas, embora subordinado ao sub-gerente executivos no organograma, reportava-se diretamente ao gerente geral.   Tinha um bonito e amplo escritório,  que comportava uma mesa de reuniões para oito pessoas, e  uma janela que dava  vista para o Viaduto do Chá, e, pela primeira vez na vida, uma secretaria particular.  Aos poucos fui me adaptando a este novo mundo, e não demorou muito para eu perceber que eu tinha algumas vantagens.  Para começar, ninguém no hotel  conhecia mais  todos os processos e rotinas internas de Hotéis Othon do que eu.  Como eu havia estagiado no Leme Palace, e no Escritório Central, a ainda passado quase três anos no Hotel Castro Alves, onde todos as rotinas burocráticas era de responsabilidade do gerente, eu não sabia apenas interpretar os diversos relatórios gerenciais, mas sabia confecionar-los também.  Eu também entendia muito da CLT, e toda a burocracia trabalhista ligada a movimentação de pessoal e a confecção da folha de pagamento.   Como o Othon Palace era um hotel grande, muito departamentalizado, as pessoas só conheciam as rotinas do seu próprio departamento, enquanto eu, que vinha de um hotel pequeno, conhecia todas. Uma outra vantagem que eu tinha e que enquanto o pessoal de São Paulo não tinha muita intimidade com os temidos burocratas do Escritório Central no Rio, eu não apenas conhecia as pessoas,  mas  me dava bem com todos, e isto facilitavam muitos os entendimentos quando havia algum questionamento.  Com estas vantagens, fui logo conquistando a confiança dos demais gerentes e chefes de departamentos, e não  tive dificuldade de ser aceito como chefe, mesmo tendo apenas 26 anos de idade e tendo que lidar com profissionais muito mais experientes que eu.    Outro fato que me ajudou muito foi a capacidade de me comunicar bem na língua inglesa com o gerente geral, um suico recem chegado ao Brasil, que falava espanhol razoavelmente bem, mas não português.  Ele tinha trabalhado anteriormente na cadeia Intercontinental, na África, e no Oriente Médio, e o idioma inglês era sua língua preferida.  Eu tinha uma reunião formal com ele de uma hora, todas as manhas, junto com o gerente de alimentos e bebidas, quando ele fazia suas observacoes sobre a qualidade dos serviços e o movimento do hotel em geral.  O gerente de alimentos e bebidas era um jovem alemão, apenas três ou quatro anos mais velho que eu, mas com pouco tempo de Brasil, e  o gerente geral infernizava a vida dele.  Em parte, porque o gerente geral era também um “expert” na área de alimentos e bebidas, tendo já exercido a função de gerente de alimentos e bebidas em outros hotéis no exterior, e também, em parte, eu desconfio, porque o suico também não simpatizava muito com os alemães.  Também contribuía para o desgaste o fato que a esposa do gerente geral era uma senhora argentina, de temperamento difícil, que diariamente tinha queixas  sobre o Room Service, de qual era a cliente principal, já que morava no hotel.  As nossas reuniões então invariavelmente começavam com um serie de criticas dirigidas ao gerente de alimentos e bebidas em função da falta de qualidade dos alimentos servidos, ou da morosidade no atendimento do pessoal de Room Service.  Por mais que o gerente de alimentos e bebidas se esforçasse para contornar os problemas, nada satisfazia a exigente argentina, nem o irado suico.  Eu tentava amenizar um pouco a situação, pois sabia que as reclamacoes eram muitas vezes injustas, mas não havia muito que eu pudesse fazer.

         Fora estas reuniões diários, havia também toda semana a reunião dos Chefes de Departamento, reunindo em torno de vinte pessoas, sempre conduzido pelo gerente geral.  Eram reuniões formais, e da maior importância, onde se discutia todos os assuntos importantes e decidia providências a serem tomadas.  O follow-up e cobrança implacável aos gerentes dos assuntos pendentes de reuniões anteriores eram a marca registrada dessas reuniões.  De qualquer forma, para mim, ter a oportunidade de  observar de perto a atuacao de um gerente geral com experiência internacional numa cadeia de grande prestigio foi de um valor inestimável.  Era impressionante como ele analisava os resultados do hotel, e como ele cobrava resultados dos demais gerentes.  Ele se preocupava muito com a qualidade dos serviços prestados e passava sempre um bom tempo analisando os questionarios preenchidos pelos hospedes, e procurando sempre formas de aprimorar os serviços.  Mesmo assim, ficou logo evidente, que o poder real dentro do hotel ainda era exercido por Cortez. O fato que o Cortez havia passado quase dois anos no hotel como gerente geral, e feito tanto a reforma administrativa como a reforma fisica das instalacoes, fazia que ele, mesmo exercendo o cargo de Superintendente de Operacoes no Rio de Janeiro, nao se desligava da rotina diaria do hotel.   Diariamente, o gerente geral tinha que telefonar para Cortez no Rio para comentar as coisas mais importantes que havia ocorrido, como estava o movimento, etc., e há cada 15 dias o Cortez visitava o hotel, normalmente ficando três dias em cada visita.  Para isso, ele mantinha ate um escritório montado para seu uso exclusivo, enquanto estava na cidade.  Durante estas visitas ele costumava passar horas reunidos com o gerente-geral, que por sua vez ficava incomunicável, pois as reuniões com Cortez não podiam ser interrompidos, sob hipótese alguma. Foi justamente numa dessas ocasiões que ocorreu um caso inusitado, que passarei a contar no capitulo seguinte. 

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