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quinta-feira, 16 de junho de 2011

A Noite Paulista

        As visitas do Cortez a Sao Paulo eram sempre um acontecimento.  O estilo gerencial que ele adotava contrastava vividamente com o estilo austero e conservador que era a cultura reinante ate entao dentro do grupo Othon, mas como Cortez representava a modernidade, e como ele tinha sido incumbido de “modernizar” o grupo Othon para enfrentar a concorrencia das multinacionais que chegava no Brasil, tudo para ele era permitido.  Geralmente, ele mandava seu automovel Mercedes-Benz do Rio de Janeiro de caminhao para ficar a sua disposicao em Sao Paulo, embora ele normalmente nao permanecia mais que tre dias na cidade.  O carro costumava ficar o dia todo na porta do hotel a sua disposicao, mas Cortez somente o utilizava a noite, pois era um assidio frequentador da “noite” paulista,  ou mais precisamente,  a famosissima e luxuosa boite  “La Licorne”,  muito conhecida na epoca.  Normalmente, a noite do Cortez comecava as 18 horas, quando, quase ele descia do seu escritorio no segundo andar do hotel para o Bar do hotel, sempre acompanhado pelo gerente geral e mais dois ou tres assesores  para beber Cutty Sark, o seu whisky preferido.  Nessas ocasioes ele gostava de contar historias sobre suas experiencias em hotelaria, ou entao tecer comentarios sobre a empresa e as dificuldades que ele enfrentava no Escritorio Central na sua tentativa de modernizar a administracao do grupo.   Eram historias fascinantes, contados com muito humor, e  Cortez era um bom contador de historias.   Inicialmente, eu nao fazia parte desse grupo “seleto”  que bebia com Cortez no Bar do hotel, mas depois de algum tempo passei a ser convidado por Cortez a me integrar a esse grupo , o que representava  uma clara sinal deprestigio -e , as vezes, ainda era convidado a jantar com o grupo, o que significava maior prestigio ainda.   O sinal de maior prestigio de todos entretanto ocorreu certa noite quando estavamos bebendo no Bar e Cortez virou para mim e disse  “Esta noite vamos todos ao La Licorne, passa no caixa de recepcao e retire dinheiro suficiente para pagar a conta da boite.  Voce sera o responsavel pelo pagamento da conta  e amanha voce presta conta da despesa”  E assim, fomos todos ao “La Licorne”, uma casa de grande luxo que havia se tornado quase um ponto de visitacao obrigatoria para qualquer visitante masculino, brasileiro ou estrangeiro, que se encontrava na cidade.  Era mesmo um lugar deslumbrante, e as “senhoritas”  que a frquentavam, eram mais deslumbrantes ainda, todas vestidas com modelos longos, trazidos de Paris, e muito elegantes.  As mocas ficavam circulando no salao, e nao era permitido  abordar os frequentadores.  Somente  se fossem convidadas poderiam sentar nas mesas para conversar e tomar um drinque.  Parecia um a mistura de desfile de moda com um desfile de beleza, tudo acompanhado por musica ao vivo e um servico impecavel, realmente inesquecivel.   Embora as “mocas” estivessem disponiveis para “servicos extras”, muitos frequentadores limitavam-se a apreciar a beleza do local, ouvir musica boa e apenas conversar com alguma moca, enquanto bebiam.  Foi o que se sucedeu com nosso grupo nesta noite e no fim da noite, conforme combinado, paguei as despesas do grupo, tendo o cuidado de solicitar a nota fiscal. No dia dia seguinte preparei o comprovante de caixa, com a nota fiscal anexa, para Cortez aprovar.  Quando levei o comprovante para ele assinar ele olhou, e perguntou “O que e isso?” “E o comprovante da despesa de ontem, no “La Licorne””, eu respondi, “mas aqui no comprovante nao esta escrito “La Licorne”” ele argumentou, “E por que o nome da razao social da empresa nao e essa. “La Licorne” e apenas o nome comercial da casa, e nao consta na nota fiscal”, respondi.  Ai, o Cortez rasgou o comprovante em pedacos, e me disse “ Entao refaca o comprovante, e depois da razao social, coloca entre parentesis “La Licorne”.  Quando isso bater na contabilidade no Rio de Janeiro, quero que todos saibam onde e que eu estive”  Era um claro afronto aos padroes conservadores da companhia na epoca, mas Cortez representava o novo poder, e gostava de exibir-lo.

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