Total de visualizações de página

terça-feira, 28 de junho de 2011

De volta para o Rio

         No inicio de 1973 o gerente geral suico, que não havia se adaptado bem ao Brasil, deixou a companhia e foi substituído por Eugene Auer, um alemão que Cortez havia recrutado do grupo Westin, no México.  Auer tinha um estilo muito germânico de atuar e as reuniões semanais com os chefes de departamento era um terror para os participantes.  Auer não admitia que as questões pendentes das reuniões anteriores não tivessem sido resolvidos e a cobrança era implacável.  As reuniões eram conduzidas na língua inglesa, pois Auer não falava português, e me recordo de uma cena típica quando ele, aborrecido por causa de uma longa explicação de porque um certo  assunto ainda não tinha ser resolvido, virou para o gerente responsável e gritou  “I WANT ACTION, MR. FONSECA, DO YOU UNDERSTAND? ACTION!!  Cada vez que ele pronunciava a palavra “action” ele socava a mesa com tanta forca que a mesa toda estremecia.  O estilo do  Auer deixava os nervos dos gerentes e chefes de departamentos em frangalhos, mas, pelo menos no curto prazo,deu certos resultados pois ninguém queria se alvo do ira do gerente geral.  Fora esses rompantes nas reuniões, o convívio diário com Auer era bastante agradável e enriquecedor para mim, pois ele era um gerente bem experiente.  Quando ele foi contratado Cortez havia prometido que ele seria designado gerente geral do Bahia Othon, o novo hotel de cinco estrelas que o grupo estava construindo na praia de Ondina em Salvador, mas os  dois acabaram de desentendendo e o Auer acabou deixando o Brasil para continuar sua carreira na Europa, chegando a alcançar o posto de vice-presidente para o Oriente Médio no grupo Sheraton.  Depois de quase um ano em São Paulo, Cortez decidiu me trazer de volta para o Rio,  para ser o Gerente Residente no Leme Palace, e auxiliar o novo gerente geral, um italiano chamado Capelesso que Cortez  havia  recrutado no México, assim como Auer.   Para mim, voltar para o Leme Palace foi muito prazeroso pois eu conhecia o hotel como a palma da minha mao, fruto dos dois anos que eu havia passado no hotel como "trainee", alguns anos antes, mas nao demorou muito tempo para eu perceber que trabalhar com Capelesso nao iria ser nada facil.  Embora se tratava de uma excelente pessoa, de bom coração, bem-humorado, e atencioso com todo mundo, era de longe o mais limitado dos gerentes gerais “importados” com quem trabalhei diretamente.  Na verdade, Capelesso nunca tinha sido gerente geral antes de assumir este cargo no Leme Palace.  No México ele tinha sido o gerente de alimentos e bebidas num hotel da cadeia Hilton e ate para esta função era questionável sua competência.  O que o italiano era na verdade, e o que ele tinha sido durante boa parte de sua carreira, era um maitre d`hotel.  Como maitre, era excelente, um dos melhores, mas como gerente, e executivo, deixava a desejar.   Os problemas com ele começaram logo na sua cocktail de apresentação para os membros do  conselho do Othon quando  ele disse para os conselheiros que em hotel que ele administrava, o custo direto de comestíveis não passava de 28%.  Este percentual era talvez normal na época no México, como e normal hoje no Brasil, mas na  década de `70, pelo menos nos hotéis da cadeia Othon, este percentual flutuava na faixa entre 40 a 45%, e poucos hotéis conseguiam custos abaixo de 40%, inclusive o Leme Palace.  Quando o cocktail terminou, o Cortez virou para o italiano, e disse, “Para que você foi dizer para o conselho que consegue um custo de comestíveis abaixo de 28%?  Eles não entendem nada disso, mas a partir de agora eles vão passar a conferir o custo todo mês e vão cobrar isso de voce.  E bom você ficar de olho!”.  Bem, depois do primeiro mês, o custo de comestíveis fechou com 42%, no segundo mês fechou com 43%, e no terceiro mês fechou com 44%.  O Cortez estava furioso, e cobrava resultados do italiano, e este se convenceu que o problema era com o atual Chefe de Cozinha, e que a solução só viria com a substituição do atual chefe por um chefe da confiança do Italiano, que viria do México.  Depois de alguma hesitação, Cortez acabou concordando com a proposta do Capelesso e autorizou a contratação do novo chefe de cozinha,  claro com grande investimento em passagens, aluguel de apartamento,  salário de dólares, etc.  Finalmente,  chegou o chefe novo, um alemão, casado com uma mexicana, e que havia trabalhado no México durante vinte anos. Era nele que Capelesso  depositava todas as suas esperanças que agora, finalmente, o custo de comestíveis iria baixar para 28%.  Só que, no primeiro mês do novo chefe o custo fechou com 46%, no segundo com 48%, e só não fechou acima de 50% no terceiro mês porque nos últimos dias do mês o italiano “engavetou” todas as requisicoes ao almoxarifado, para apenas lançar-as no começo do mês seguinte.  A coisa estava feia, mas iria ficar mais feia ainda.  Certo dia, o Chefe não apareceu para trabalhar.  Não era a folga dele, e ele não telefonou para justificar sua ausência.  No fim da tarde o Capelesso me chamou e disse, “Vamos ate o apartamento do Chefe em Copacabana.  Pegue o endereço dele  no departamento de pessoal.  Era um endereço na rua Barata Ribeiro, num daqueles prédios que tem dezenas de apartamentos por andar.  Fomos ate la, subimos ate o andar e tocamos a campainha, e nada.  Nenhuma resposta.  Descemos ate a portaria e perguntamos ao porteiro, “Nos estamos procurando o Hans, do apartamento 412, você tem visto ele”, “Hoje, nao”, respondeu o porteiro, “mas ontem a noite vi ele saindo com a mulher e uma monte de malas, acho que ele foi viajar, mas ele não disse para onde ia”.  Olhei para o Capelesso, mas este já estava inconsolavel, sentou na escada, e com as mãos no rosto, e entre soluços,  repetia sem parar, “filho da puta, filho da puta, filho da puta”  “O que foi”, perguntei, tentando acalma-lo, “pode ser que ele volte”, falei, sem muita convicção.  “Nao vai voltar nao” me respondeu o italiano, “na semana passada ele me pediu cinco mil dólares emprestados.  Disse que era para comprar um carro”  “E você emprestou o dinheiro?”, perguntei,   “Emprestei sim,....... filho da puta, filho da puta, filho da puta...”.  Bem, o chefe sumiu mesmo.  Soubemos depois que ele havia voltado para México, e nunca mais  deu noticias.

Nenhum comentário:

Postar um comentário