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domingo, 3 de abril de 2011

O Hotel Castro Alves

         Nessa altura, eu já tinha acumulado uma razoável experiência na gestão dos hotéis menores, e no final de 1969 surgiu uma grande oportunidade. Fui chamado a sala do Diretor no Escritório Central, e ele, sempre muito formal,  me comunicou “O Gerente do Hotel Castro Alves vai ser transferido para o Hotel Lancaster, e o Senhor vai ser o novo gerente do Castro Alves". Ele me deu uma breve explanação de quais seriam minhas novas responsabilididades, e terminou com uma advertência, "Como gerente,  o Senhor terá que morar no hotel e vai ter direito a desfrutar, gratuitamente, dos serviços do hotel. Lembra-se que isto e um privilegio que não devera ser abusado. O Senhor se limita a pedir comida mais simples, e nada de pedir camarão ou lagosta, ou outros pratos caros.  O consumo de qualquer bebida alcoólica esta excluída desse direito, com excecao de cerveja, desde que consumida, com moderação, durante o almoço ou o jantar.. O Senhor se apresenta no Hotel Castro Alves amanha as 8 horas da manha pois durante uma semana o gerente vai lhe passar o serviço, depois ele vai para o Lancaster. Boa tarde.”  Sai da sua sala meio tonto, mas muito alegre.  Era uma promoção enorme, e embora eu já estava na companhia fazia  quatro anos e meio, eu ainda tinha apenas 23 anos de idade, e seria, de longe, o gerente mais novo da companhia.  Fora isso, a economia que eu faria morando e no hotel seria enorme.  Eu havia casado há apenas três meses, e o aluguel e taxa de condominio dum pequeno apartamento em Ipanema consumia quase a metade do meu salário.  E verdade, que o Hotel Castro Alves era um hotel modesto,  de três estrelas, com 78 apartamentos, localizado na Av. N.S. de Copacabana 552, defronte para a Praça Serzedelo Correia, mas conhecida popularmente na época como “A Praça dos Paraibas”, devido ao grande numero de nordestinos que congregavam-se la aos domingos.  Apesar de modesto,  era um hotel do grupo Othon, e isso bastava para tornar-lo respeitado.  Ao todo, fiquei  dois anos e sete meses como gerente do Castro Alves, e foi sem duvida uma etapa fundamental no desenvolvimento da minha carreira.  Pela primeira vez, eu estava numa posição de comando.  Era eu que tinha tomar todas as decisões importantes, pois no hotel haviam 48 funcionários, e mais o gerente.  O gerente era responsável por tudo, desde a supervisão das áreas operacionais, ate a execução de todo o trabalho burocrático.  Era um verdadeiro "faz de tudo".  Para se ter uma ideia, O gerente era o caixa geral, que fechava o caixa diário e ainda levava o dinheiro e cheques recebidos para depositar no banco.  O gerente era também o chefe de pessoal, que admitia, demitia, advertia, ou suspendia os funcionários, conforme os casos que iam ocorrendo.  Era o gerente que cuidava das reservas, e respondia todas as cartas de solicitação de reservas.  Era o gerente que resolvia qualquer problemas com os hospedes. Era o gerente que preparava o quadro de horários e escalas de revezamento, para todo o hotel.  Era o gerente que exercia a função de chefe de compras, e também de almoxarife.  Era o gerente que controlava o custo de alimentos e bebidas, e era o gerente que confeccionava o relatório diário, fazia os inventários mensais, e ainda mantinham o Escritório Central informados de todo o movimento diário.  Para cumprir todas estas tarefas, era preciso chegar cedo no escritório, sempre antes das 8 horas, e com apenas meia hora para o almoço, era normal trabalhar ate 19 ou 20 , diariamente. Era também obrigatório trabalhar aos sábados, pelo menos ate o meio-dia, e no fim do mês, quando realizava os inventários e fechava todos os relatórios mensais, o trabalho nunca terminava antes de meia-noite.  Era um trabalho  cansativo, mas era também um trabalho muito gratificante.  Nada melhor que executar um serviço sabendo que você e o único responsável , e o orgulho que se sentia ao cumprir todos os prazos, e com um trabalho bem apresentado, era causa de muita satisfação. 
         Uma boa parte do trabalho do gerente dizia respeito ao trabalho burocrático, e nos hotéis menores da companhia, como o Castro Alves, a maioria dos gerentes tinham um perfil mais adequado ao cargo de Chefe de Escritório, de que propriamente Gerente de Hotel.  Mesmo assim, era necessário também supervisionar as áreas operacionais, e pelo duas vezes ao dia, eu fazia uma volta completa pelo hotel.  Com isso, ia tomando contacto direto com cada um dos 48 funcionários, e aos poucos fui formando um otimo espírito de equipe  dentro do hotel.  A minha experiência recente de "trainee" no Leme Palace havia me ensinado muito coisa sobre o valor do funcionário subalterno, e eu estava determinado a me tornar um gerente acessível e mais proximo aos funcionários. Uma das formas que isto se manifestava era na formação da equipe de futebol de praia que disputava jogos e torneios com os outros hotéis.  Ate então, o Castro Alves não disputava esses torneios pois dispunha de poucos funcionários – apenas 48 – e isso incluía as mulheres e vários homens mais idosos que nem sequer podiam jogar futebol, mas logo conseguimos montar nosso primeiro time, e disputar algumas partidas amistosas.  Logo percebemos que era preciso reforçar o time se a intenção era de disputar o campeonato, sem fazer um vexame.  Uma das poucas funcoes que tinham um “turnover” razoável era de faxineiros – o hotel tinha quatro faxineiros – pois quando surgia alguma vaga de arrumador, ou copeiro, ou mensageiro, era preenchido promovendo um faxineiro para a função e contratava um novo faxineiro.  Quando se contratava um novo faxineiro – geralmente jovens com idade entre 18 e 20 anos , buscava jovens que haviam  cumpridos o serviço militar, e dados baixa como reservistas de primeira categoria, sempre um sinal positivo.  Procurava também aqueles que demonstravam ambicoes e tivessem também  atitudes positivas, pois isso era importante para eles seguissem na carreira.   Passamos então a buscar outro atributo nos novos candidatos – que soubessem jogar futebol.  Com esta politica de recrutamento, o Castro Alves foi aos poucos formando um otimo time, -se uma forca respeitada no mundo futebolistica hoteleira.  Chegamos a conquistar vários troféus, e derrotamos hotéis cinco ou seis vezes maiores que nos.  Os troféus conquistados eram exibidos na Portaria de Serviço e eram motivo de muito orgulho para todos.

Um comentário:

  1. Parabéns pela iniciativa Sr.Carruthers.

    Os academicos, historiadores e hoteleiros do futuro terão referências importantes de um profissional que acompanhou o desenvolvimento do setor no País.

    Fiquei sabendo através de link do Prof. Bayard.

    Saudações,
    Bernardo Liao (bernardo@indigoconsult.com.br)

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