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segunda-feira, 28 de março de 2011

A Delegacia

         Depois de quase um ano como sub-gerente no Hotel Trocadero, fui promovido a funcao de gerente tornante, isto e, substituia os gerentes dos hoteis menores do Rio quando estes saiem de ferias.  E assim, durante quatro meses substitui respectivamente os gerentes dos hoteis Aeroporto, Olinda, California  e Savoy.  Nao era uma funcao facil, pois, alem de ter que dominar toda a rotina burocratica do escritorio, era preciso adaptar-se ao estilo gerencial de cada gerente, pois cada um tinha sua pecularidade.  Era tambem necessario ter uma boa dose de diplomacia, pois os gerentes titulares viam o “tornante”  com uma certa desconfianca,  pois no passado varios “tornantes” haviam aproveitados a funcao para mostrar servico e  aparecer bem junto ao Escritorio Central, normalmente deixando o gerente titular numa situacao desconfortavel.  Tive, desde o inicio, o bom senso de perceber que isto nao seria um bom caminho, principalmente para alguem que ainda estava no comeco da carreira e ainda tinha muito a aprender.  Eu tentava entao assimilar o estilo de cada gerente e dar sequencia ao trabalho que vinha sendo realizado, sem me preocupar com inovacoes.  Isso acabou me rendendo frutos pois uma vez que os gerentes passava a ter mais confianca em mim, acabavam me mostrando mais detalhes do trabalho, e consequentemente o aprendizado e a experiencia foi melhor. 
         Foi nesta epoca, enquanto substituia o gerente do Hotel Savoy que ocorreu o primeiro incidente e me levou ate a delegacia.  Naquele tempo,  nao havia cartoes de credito, e o credito do hospede era determinadado pela quantia de bagagem que trazia.  Um hospede sem bagagem, ao menos que fosse um hospede habitual, tinha que pre-pagar para ser aceito no hotel, mas, com bagagem, o credito era concedido.  Mesmo assim, o sistema nao era perfeito, pois havia hospedes que carregavam tijolos nas malas, e mantinham as malas trancadas, e havia outros que iam saindo aos poucos com as roupas, deixando apenas as malas vazias, e varios outros truques.  Consequentemente a quantia de “skippers” era bem maior do que hoje, e era um problema que exigia constante vigilancia.  Para facilitar esta vigilancia, circulava entre os hoteis, ha cada quinze dias, uma lista contendo os nomes dos “hospedes indesejaveis”, termo utlilizado  para descrever os  maus pagadores.  Era uma funcao da gerencia, ao receber a tal lista, checar primeiro entre os hospedes na casa, e depois nas reservas futuras, para saber se algum nome coincidente.  Eu estava apenas ha tres dias no Hotel Savoy ,quando chegou a lista de “hospedes indesejaveis” da quinzena.  Fiz o cruzamento da lista com os nomes dos "hospedes indesejaveis" com a lista dos hospedes do hotel  e me espantei ao encontrar o nome do hospede do apartamento 801 na lista.  Liguei para a Recepcao para saber se o hospede era conhecido, e fui informado que nao, era a primeira vez que ele se hospedava no hotel.  Alem disso, a Recepcao me informou que o hospede havia chegado, sem reserva previa, ha quatro dias, e neste tempo havia feito muitas despesas de bar e restaurante - um outro sinal de alerta.   A recepcao ainda me informou que o tal hospede tinha acabado de subir para o seu apartamento, acompanhado por mais dois homens. Tudo indicava que tinhamos um "skipper" na casa, e caberia a mim resolver!  Por sorte, o gerente do hotel  ainda se se encontrava no seu apartamento no hotel, onde morava, pois so viajaria em ferias no dia seguinte. Liguei para ele e contei o que eu havia descoberto.  Era um gerente que adorava este tipo de situacao, e em menos de dois minutos ele estava no escritorio, examinando a documentacao.  Ao perceber que todas as evidencias indicavam a existencia de um “hospede indesejavel” no hotel, o gerente ligou para um inspetor da policia amigo dele, que em menos de quinze minutos chegou ao hotel, acompanhado por um colega.   Os policiais, junto com o gerente, decidirem que deviam “invadir” o apartamento 801 e fui convocado para acompanhar esta operacao.  Chegamos lentamente e silenciosamente defronte do apartamento 801, e ai paramos por alguns instantes.  Dava para ouvir os ocupantes do apartamento conversando animadamente entre si.  Neste instante os dois policiais sacaram suas armas e, utilizando a chave mestre para abrir a porta,  entraram gritando “ESTA TODO MUNDO PRESO, MAOS NA CABECA” Os tres  ocupante do apartamento quase morrerem de susto e nao tiveram tempo de reagir, “CADE AS ARMAS?” gritou um policial, “Nao temos armas”, foi a resposta do “indesejavel”, que tomou logo um tapa na cabeca por assim ter respondido, “CADE AS ARMAS, PORRA?” repetiu o policial,  dando mais um tapa na cabeca do “indesejavel”.  Enquanto isso o outro policial revistava  todo o apartamento,  esvaziando todas as gavetas e malas e ate virando o colchao, ate se convencer que de fato nao havia armas escondidas.  Depois de um breve interrogatorio, decidiu liberar os dois acompanhantes do “indesejavel” por julgar que eles nada tinham a ver  com o caso, e depois viraram para o “indesejavel” e disserem, “aqui esta a sua conta, cade o dinheiro para pagar?”.  Bem, e claro, nao havia dinheiro, e o jeito era levar o individuo para a delegacia e registrar uma queixa crime.  Ao chegar na Delegacia, verificou que o "hospede" tinha varias identidades falsas, e ja tinha uma extensa ficha de estelionatario.  Foi autuado mais uma vez e ficou alguns dias trancado numa pequena cela da delegacia, junto com mais 20 presos.  Para mim, o episodio valeu um meio elogio do Diretor, sempre muito severo.  Embora ele reconheceu que fui atento em perceber logo que havia um "hospede indesejavel" no hotel, achou que devia ter percebido logo no segundo dia que o hospedava estava fazendo muitos gastos no hotel, e assim teria evitado que o prejuizo do hotel aumentasse.

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