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sábado, 16 de julho de 2011

Uma Odisseia Europeia

         Cheguei em Londres no começo de Novembro.  O inverno já havia chegado e fazia muito frio.  No segundo dia que eu estava la cai na cama com um febre de quase 40 graus,  O medico foi chamado e diagnosticou um forte gripe, mas ainda me colocou sob observação caso eu estava acometido de alguma doença tropical.  Levei uma semana para me recuperar  do gripe.  Não foi um bom começo, mas a situação ainda iria piorar muito. E que em 6 de Outubro de 1973, totalmente inesperadamente, forcas egípcias e sírias haviam invadido a península do Sinai, iniciando o que veio a ser conhecida como a “Guerra do Yom Kippur”, entre as forcas árabes e Israel.  A guerra resultou numa derrota para as forcas árabes mas estes, em represália ao apoio que a  Europa e Estados Unidos haviam prestados a Israel, decretaram um embargo de petróleo e provocaram a primeira grande crise de petróleo no mundo, jogando toda a Europa e boa parte do mundo numa recessão.   Na Gra Bretanha,  a situação ficou ainda pior porque o governo conservador da época  se encontravam numa disputa ferrenho sobre revindicacoes salariais com o poderoso sindicato dos mineiros de carvão, e o embargo de petróleo  caiu como uma luva para os sindicalistas, que aproveitaram para aumentar ainda mais as suas exigências.  O governo tentou negociar uma saída, mas o sindicato foi irredutível, não abria mão de nenhuma exigência.  Com os estoques de carvão acabando, e sem contar com o petróleo do Oriente Medio, o pais estava ficando sem energia.  O governo então decretou um serie de medidas de emergência, incluindo cortes de fornecimento de energia, e suspensão de atividades não-essenciais, e por fim decretou a “semana de três dias” que determinava que todas as industrias so poderiam trabalhar por três dias durante a semana.  Era uma medida extrema, tomada com a intenção de conservar o que podia dos estoques de carvão, mas teve um efeito avassalador sobre a economia do pais, com prejuízos estimados em um bilhao de libras por semana.  Na primeira semana de vigência do decreto, 800 mil pessoas perderem seus empregos, e em pouco tempo havia mais de três milhões de desempregados.   O efeito para a hotelaria de Londres  foi catastrofico.  Todas as empresas suspenderem viagens de empregados e as fotos de Londres que corriam o mundo, mostravam lojistas trabalhando com luz de vela e agasalhados ate o pescoço por causa do frio, pois não havia aquecimento nas casas, e isto afastava totalmente os turistas estrangeiros.  Os hotéis, antes habituadas a ocupacoes na casa dos 80%, estavam com menos de 20% de ocupação.  Foi neste cenário que cheguei procurando emprego.    Em hotel após hotel, ouvi a mesma historia.  “Sinto muito”, me disse a Diretora de Recursos Humanos de um grande hotel que antes havia praticamente me garantida um emprego, “mas já tivemos que demitir  40% do nosso efetivo e temos ordens expressas da matriz que todas as novas contratacoes estão suspensas”, “Mas eu vim do Brasil, contando com esse emprego”,  “Eu sinto muito”, foi a resposta, “mas você volta quando esse crise passar”.  Pelo menos eu estava hospedado na casa dos meus avós, e não passava fome, mas na medida em que as semanas passavam, e nada melhorava, comecei a ficar preocupado.  No final do ano nada havia mudado e fui passar o Natal e Reveillon com minha família em Viena.  Em Janeiro, voltamos todos para Inglaterra,hospedados na casa dos meus avós no norte da Inglaterra.  A situação no pais continuava critica, mas finalmente, no inicio de marco de `74 recebi um telefonema animador do Diretor de Penta Hotels em Londres, que me disse “Olha, tenho uma posição interessante para você.  Não e exatamente o que você queria, por que não e na Inglaterra, e para Lisboa, Portugal.  Nos estamos construindo um hotel de 600 apartamentos em Lisboa, que deve ficar pronto em Outubro deste ano,  e precisamos de um gerente residente, que se reportara diretamente ao gerente-geral.  Ja nomeamos o gerente geral, que e um cidadao alemao muito experiente, mas  nao fala portugues. Com seu curriculum, e com sua fluência em português, você e a pessoa perfeita”  Ele  me deu mais algumas informacoes sobre o salário e os benefícios oferecidos, e perguntou “Voce aceita?”  E claro que aceitei na hora, pois não estava em condicoes de negociar nada, e alem disso era um emprego  interessante, e ir para Lisboa não seria nada ruim.  “Otimo”, disse o diretor.  “Voce começa em Abril.  O gerente-geral esta vindo para Londres dentro de 15 dias, e ai você vem para conhece-lo, e acertar os ponteiros sobre moradia em Lisboa antes do hotel ficar pronto.”  A noite saimos para comemorar a boa noticia, pois finalmente eu estava vendo a luz no fim do túnel.  Infelizmente, foi so uma ilusao.  Três dias depois, recebi um telefonema urgente da minha madrasta, Gracinha, de Recife.  Eram noticias preocupantes sobre o estado de saúde do meu Pai.  Em Janeiro, ele havia sido operado com urgência em São Paulo, pois os médicos haviam diagnosticado um câncer de pulmão, mas agora a noticia era que havia formado um tumor no cérebro e meu Pai estava muito mal num hospital de Recife.  Eu era o filho mais velho, e Gracinha pedia minha presença em Recife.  Liguei para o Diretor do Penta Hotels, e expliquei a situação.  Ele foi compreensivo, e sugeriu que na volta de Recife eu pegasse um avião que fizesse escala em Lisboa, pois assim eu visitaria o local da obra do hotel e conheceria o gerente-geral “em-loco”, e com isso resolvido, viajei para Recife.  Chegando la, era como se estivesse entrando num outro mundo.  A crise, que havia afetada toda a Europa, ainda não havia chegado ao Brasil.  Ainda se vivia os últimos momentos do “milagre brasileiro”, e o contraste com Europa não podia ser maior. Aparentemente, a minha chegada em Recife fez bem ao meu Pai porque aos poucos ele  foi melhorando, e uma semana após a minha chegada já estava em condicoes de voltar para casa.  Com isso, fiz planos para voltar para Europa, e acertei a minha viagem de volta, já passando por Lisboa.  Na véspera da minha viagem de volta, entretanto, meu Pai teve uma recaída, e voltou a ser hospitalizado, e tive que adiar a minha volta, ficando mais alguns dias em Recife.  Essa situação se repetiu mais uma ou duas vezes, ate chegar em meados de Abril, quando senti que o pessoal do Penta já começava a se impacientar com minha demora em voltar.  Expliquei a situação para Gracinha, e disse-lhe que teria que voltar de qualquer maneira para Europa, pois caso contrario corria o risco de perder a oportunidade em Lisboa. Consequentemente,  marquei minha viagem para 26 de Abril de 1974.  Acertei tudo com o pessoal da Penta, e o gerente-geral me disse que mandaria seu carro me buscar no aeroporto de Lisboa.  Na manha do dia 25, eu estava sentado no jardim da casa do meu Pai, pegando um pouco de sol enquanto lia um livro e ouvia musica num radio de pilha.  De repente, a programação musical do radio foi interrompido com um boletim de noticias,  “Tropas rebeldes avançam sobre a sede do governo português.  Declarado toque de recolher em toda a capital.  O aeroporto de Lisboa esta cercado por tropas rebeldes”.  Era 25 de Abril de 1974.  A “Revolucao dos Cravos”, um golpe de estado militar que derrubou o regime ditatorial Salazarista havia iniciada, criando uma grande turbulência social, politica, económica, e militar no pais, que iria durar alguns anos.  O projeto da construção do Hotel Penta foi abandonada, e com isso, a minha ida para Lisboa, assim como a minha volta para Europa, estava definitivamente encerrada.

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