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segunda-feira, 25 de julho de 2011

Chegando na Bahia

        O Bahia Othon era um belo hotel, muito bem projetado e decorado de uma forma original que combinava as caracteristicas coloniais portugueses de Salvador com cores vivas que refletiam a influencia africana da cidade.  A localização, numa colina defronte da praia de Ondina era excepcional, e proporcionava belas vistas de todos os apartamentos.  Havia um restaurante de luxo, e um outro tipo “coffee shop” para refeicoes informais, uma área de eventos com salões com capacidade para 600 pessoas, uma bela piscina, dois bares, e uma galeria de lojas.  Alem disso,  ainda abrigava nas suas dependências o filial baiano da famosa casa noturna “Hippopotamus”.  Alem dessas belas instalacoes do “front of the house”, a parte do serviço do hotel havia sido muito bem projetado, de forma que o hotel estava muito bem equipado para oferecer um serviço diferenciado ao seus hospedes.  Em termos de instalacoes físicas, o Bahia Othon era de longe o melhor hotel que eu tinha gerenciado ate então, mas era também o mais complexo, e o que mais me exigia, em todos os sentidos.

         A maior diferencial, em comparação com Rio e São Paulo, era a falta de mão de obra qualificada.  Enquanto no Rio e São Paulo havia uma mercado de hotelaria de luxo já consolidado, com muitos bons profissionais disponíveis, na Bahia, na década de `70, este mercado era incipiente, e a dificuldade de encontrar bons profissionais era grande.  A solução era treinamento e mais treinamento, e buscar profissionais no eixo Rio/São Paulo,  ou ate do exterior.  A “importacao” de profissionais entretanto nem sempre dava certo.  Havia muitos problemas de adaptação, mesmo para quem vinha do Rio ou São Paulo, e uma tendência de culpar a mão de obra local para todas as deficiências e problemas que surgiam.  No caso do Bahia Othon,  muitos desses problemas eram originarias da calamitoso inauguração do hotel  três anos antes, ainda na “era Cortez”.  Como era politica do Cortez, o gerente geral havia sido recrutado no exterior, neste caso na Republicana Dominicana, onde havia gerenciado hotéis da cadeia Intercontinental,   e ele, por sua vez, havia trazido dezenas de outros executivos e chefes de departamento que ele conhecia da região.  O resultado foi que quase todo o corpo gerencial do hotel era composto de centro-americanos, que  falavam espanhol, mas não português, e que tinham pouco ou nenhum conhecimento sobre Brasil, e muito menos sobre a Bahia.  Para complicar ainda mais a situação, quinze dias antes da abertura do hotel o gerente-geral brigou com Cortez, e simplesmente abandonou o pais, retornando para a Republica Dominicana, e deixando os executivos que havia trazido a própria sorte, num autentico “salve-se quem puder”.  O resultado não poderia ser mais catastrofico, e o hotel abriu as portas numa situação muita critica.  Embora já havia passado três anos desse episódio quando eu cheguei na Bahia, e muita coisa já tinha melhorado, a verdade e que ainda existia um abismo enorme entre o corpo gerencial e os funcionários, e um clima de desconfiança e ate hostilidade em relação a direcao, que era um contraste grande comparado com o clima organizacional existente nos hotéis do grupo no Rio e São Paulo.  Bem, foi esse o clima que encontrei na Bahia, que eu mesmo fui obrigado a diagnosticar após a minha chegada em Salvador, pois nada disso havia sido me revelado pelo Escritório Central, que provavelmente desconhecia por completo o problema.  Para reverter esse quadro era preciso muito trabalho.  Primeiro,tinha que mudar algumas atitudes dos gerentes e chefes de departamento e comecei proibindo terminantemente qualquer referencia ou comentário pejorativo sobre baianos.  Depois eu, como gerente-geral, tinha que adotar uma postura muito mais participativa de que habitualmente se encontrava num gerente-geral num hotel de grande porte.  Era preciso combinar aspectos de uma hotel bem estruturado, com aspectos de um hotel pequeno, quando o gerente esta literalmente em toda parte.  Consequentemente,  eu fazia questão de andar por todos os cantos do hotel, de manha, de tarde, e de noite.  Andava em lugares nos subterrâneos do hotel onde poucos gerentes haviam andado antes, pois havia ameaças, alguns reais e outras imaginarias, sobre as possíveis consequencias se fizessem.  Era esse o clima de hostilidade a que me referi antes, e nada na minha experiência ate entao se comparava com o clima hostil que encontrei na Bahia.  Felizmente, a experiência adquirida nos tempos de “trainee”, quando passei por todos os setores do hotel, e a facilidade que tinha adquirida para lidar com as pessoas de diferentes níveis hierárquicos, e principalmente de respeitar-los,  foi me ajudando muito.  Com isso, pouco a pouco, fui conquistando a confiança dos funcionários .  As vezes era só um cumprimento, ou um sorriso, e as vezes parava para observar algum trabalho sendo executado, e fazia perguntas sobre o que estavam fazendo.  Depois, quando havia alguma medida disciplinar a ser tomada, agia sempre com isencao, e transparencia.  Tomei as medidas administrativas necessárias para acabar com os atrasos nos dias de pagamento dos salários, coisa habitual no hotel ate minha chegada, e como expliquei aos funcionários, em mais de dez anos de trabalho na companhia, meu próprio salário jamais havia atrasado uma única vez, então como era possível que na Bahia isso fosse habitual? Fizemos um grande esforço para melhorar a qualidade do refeitório, motivo de muitas reclamacoes.  Havia, quando cheguei no hotel,  dois refeitórios, um para os gerentes e chefes de serviço, e outro para os demais funcionários.  Tratamos logo de unificar os dois refeitórios, contra a vontade de alguns gerentes, mas foi uma medida acertada, como depois todos reconheciam.  Criamos o cargo de supervisor dos vestiários, para disciplinar o uso dos mesmos, pois antes só andavam sujos e totalmente depredados.  Fizemos reuniões com os funcionários para conversar sobre os salários, e principalmente sobre a apuracao da taxa de serviço, pois havia muito desconhecimento e desconfiança sobre a forma que a mesma era apurada.  Incentivamos a formacao do time de futebol do hotel, e eu e alguns outros gerentes participavamos em algumas partidas. Com estas e outras medidas, o clima interno começou a mudar para melhor, e depois de alguns meses sentimos uma melhora significativo no andamento do hotel  Era um hotel grande, e ainda havia muitos incidentes inusitados que ocorriam, mas o clima de hostilidade e desconfianca entre a administração e os demais funcionários havia terminado.

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